Não é estranho que liberais defendam o Uber como alternativa para o transporte urbano. Utilizando uma inovação tecnológica – o smartphone -, o aplicativo fiscaliza os motoristas constantemente através das avaliações do usuário ao fim de cada corrida (motoristas com menos de 90% de aprovação são advertidos e, em caso de recorrência, suspensos) e ainda garante a segurança dos passageiros com o rastreamento via GPS de todo o trajeto percorrido, quebrando o monopólio das prefeituras na certificação de transporte com carros.

Há ainda outra vantagem, extremamente importante para os usuários: o preço. Dois serviços do Uber estão disponíveis no Brasil: o Uber Black custa o mesmo que a tarifa da “bandeira 1”, mas aceita apenas carros mais caros (em São Paulo, o mais comum é o Toyota Corolla), além de garantir ar condicionado água gelada, balas e chicletes para os passageiros; no UberX, os carros são mais comuns, embora os modelos sejam melhores que a maioria dos táxis, com direito a água para o passageiro e uma tarifa 35% menor do que o táxi de bandeira um. Não há bandeira dois, nem cobrança de taxas por uso do porta-malas.

Ao contrário do que muitos pensam, a razão das tarifas mais baratas não está no não-pagamento de impostos e tarifas. Ao contrário dos taxistas, motoristas do Uber não têm acesso a diversas isenções de impostos e subsídios do governo. O problema com o sistema de táxis é mais grave: na maioria dos casos, as prefeituras não concedem novos alvarás, uma política que não faz o menor sentido.

Nas últimas décadas, a população das cidades cresceu, a demanda por táxis também, mas nenhum novo alvará foi concedido em São Paulo ou na maioria das metrópoles brasileiras. Isso faz não apenas com que o preço das corridas seja artificialmente caro, mas também cria uma espécie de “mercado negro de alvarás”, que são vendidos por centenas de milhares de reais ou alugados por valores obscenos. Novamente usando São Paulo como exemplo, um alvará costuma ser vendido por no mínimo 200 mil reais (chegando ao milhão em pontos caros, como os de aeroportos), e o aluguel ronda os 4 mil mensais. Por isso, o sistema criou uma classe de privilegiados, com grande influência entre sindicalistas e vereadores, que enriqueceu alugando títulos para taxistas.

Liberais costumam defender o Uber como um exemplo de iniciativa empreendedora que gera concorrência e fornece um serviço melhor e mais barato, desde que não seja atrapalhada pela burocracia das prefeituras. Mas existem muitos argumentos alinhados para a esquerda defender o aplicativo: além de combater o rentismo dos donos de alvarás, o Uber atende aos interesses dos trabalhadores e diminui o número de carros na rua. Se sobrar alguma dúvida, basta assistir ao vídeo em que o presidente do Sindicato dos Taxistas diz que pobre tem que tender que quem mora na periferia não precisa de táxi (tem o vídeo no link, não é exagero nosso).

Mas isso não garantiu o apoio de políticos de esquerda. Tanto o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, quanto o de Nova York, o progressista Bill de Blasio, tentam combater – até agora, em vão – a expansão da concorrência. Justiça seja feita, também existem exemplos no campo político da direita, como o prefeito de Londres, Boris Johnson, uma das maiores lideranças conservadoras da Inglaterra. Políticos, em geral, não suportaram a novidade, mas não é difícil notar que socialistas e progressistas são mais estridentes em suas críticas.

Felizmente, existem exceções. Uma delas é Edílson Silva, deputado estadual pelo PSOL e presidente do partido em Pernambuco. Ao menos quando o assunto é o Uber, Edílson decidiu que não vale a pena andar na contramão da história. Leiam vocês mesmos o pequeno texto em que ele formula um argumento marxista a favor da inovação na mobilidade urbana.

Preparem-se! O UBER é apenas um sintoma de uma profunda revolução tecnológica. A obsolescência pela qual passam os táxis neste momento é a mesma que fez com que as enciclopédias impressas (Barsa, Delta, Britânica… alguém lembra?) fossem colocadas no rol de peças de museu.

O meu bom, velho e infalível Marx, que me fornece um método de análise do desenvolvimento do processo civilizatório a partir da compreensão da evolução da economia política, me ensina que os taxistas que hoje se debatem contra o UBER agem da mesma forma que os rebelados ingleses – liderados pelo General Ludda, denominados movimento luddista -, lutaram contra os efeitos da revolução industrial.

Naquela Inglaterra pós-feudal, o domínio do vapor e seu uso para a aplicação em máquinas de tear mecanizadas acabou gerando um exercito de desempregados entre os fabricantes artesanais de tecidos. Querer impedir a liberdade de criação e seu uso para facilitar a vida das pessoas é um ato anti-histórico. É quase como querer impedir a chegada da primavera. Ela virá.

Além do mais, se antes existiam donos de tecelagem que exploravam homens e mulheres nas suas instalações, hoje existem “donos de praça” que possuem dezenas – em alguns casos centenas – de carros de táxi, que são guiados por taxistas que trabalham de forma precarizada, pagando diárias absurdas. A dor que se sente agora, em relação ao UBER, é a dor de uma “parto” que nos traz algo melhor para a sociedade e não apenas para uma corporação.

Importante salientar que o UBER não vai acabar com os táxis, assim como as máquinas nunca acabaram com o artesanato na produção têxtil. A questão é que os táxis serão utilizados pelo seu valor de uso, ou por quem valoriza este serviço por peculiaridades mais subjetivas que objetivas (ensinamento do economista clássico David Ricardo). O Uber será utilizado por seu valor de troca, ou seja, baseado em critérios de produção de bens e serviços em escala de massa. Quem oferecer melhor preço e qualidade leva o cliente.

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