Dados de mais de um bilhão de corridas de táxi revelam que reclamações de consumidores em Nova York e Chicago têm apresentado queda constante após a chegada do Uber.

Há alguns anos, em uma corrida de táxi durante a madrugada, o taxista começou a me xingar por pedir para que ele dirigisse os 25 minutos do centro de Washington até minha casa em Maryland. Na época, eu pensei que “pelo menos ele aceitou a corrida”. Em outras ocasiões, taxistas simplesmente se recusaram a me levar para casa. Como em muitas outras vezes, eu já esperava que a máquina de cartão de crédito fosse estar misteriosamente “estragada” na hora de pagar.

Tudo isso mudou. Hoje, com alguns toques em meu telefone, um carro do Uber ou do Lyft aparece, me leva aonde preciso ir, automaticamente cobra a tarifa em cartão de crédito e envia um recibo detalhado por email. Táxis costumavam enfrentar quase nenhuma competição no transporte ponto-a-ponto sob demanda, mas agora enfrentam uma área de dura concorrência. O número de viagens de táxi em Nova York diminuiu por volta de 8% entre 2012 e 2014, e um relatório recente demonstra que o Uber realiza quase metade de todas as corridas nos maiores mercados dos EUA.


Desde a entrada do Uber no mercado, o número de corridas de táxi em Nova York diminui o crescimento e, em seguida, começou a cair

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Qualquer negócio ameaçado por novos competidores fará o melhor para manter seus atuais clientes. Em indústrias reguladas, como o negócio de táxis, parte dos esforços envolverá lobby para que políticos e burocratas proíbam os novos concorrentes. Na França, essa oposição ganhou traços violentos e resultou na prisão de dois diretores do Uber.

Mas além de fazer lobby e protestar, deve-se esperar que táxis – como preceituam as leis de mercado – tentem responder melhorando os serviços aos consumidores.

Frente a novos competidores, a primeira reação na indústria seria a redução de preços. Neste caso, no entanto, tarifas de táxi são reguladas – os preços são pré-estabelecidos e um taxista tem pouco controle sobre isso. Também seria de se esperar que a nova concorrência force os taxistas aumentarem a qualidade do serviço. Ao longo do tempo, companhias de taxi podem melhorar o serviço, modernizando suas frotas e introduzindo novas tecnologias.

Mas a qualidade de uma corrida de táxi depende de muito mais do que somente o preço e a condição do veículo. Como o raivoso taxista de Washington demonstrou quando recusou minha corrida para casa, motoristas de táxi têm algum controle sobre a qualidade da viagem. Isso levanta uma questão importante: os taxistas estão melhorando em resposta à competição?

No último outono (primavera, no Brasil), um escritor da DNAinfo em Chicago citou um taxista que disse que os motoristas estavam “tentando se comportar”, e notou uma redução no número de reclamações de táxis. Mas a conversa entre do escritor com um taxista é anedótica, e já era esperado que o número de reclamações caísse conforme a demanda por táxi cai, independentemente de concorrência. Para determinar empiricamente se taxistas estão respondendo à competição de apps como Uber e Lyft, eu resolvi ir atrás de dados que ajudassem a responder. Em um novo paper baseado em dados de Nova York, de Chicago e do Google Trends, eu apresento evidência que taxistas de fato parecem estar oferecendo um serviço melhor.

Assim como os próprios Uber e Lyft, minha análise existe graças a novas fontes de dados e ferramentas que não existiam – ou, ao menos, não eram acessíveis – há poucos anos. A cidade de Nova York mantém uma base de dados pública online com reclamações sobre o serviço de táxi desde 2010, e outras cidades estão disponibilizando estatísticas por meio de vários projetos de transparência, além de fornecerem outras informações sob pedido. Através de requerimentos baseados na Lei de Acesso à Informação, a Comissão de Táxis e Limousines de Nova York me enviou os dados de cada corrida de táxi entre 2009 e 2014, e a cidade de Chicago enviou um conjunto similar de informações sobre reclamações. No caso de Nova York, eu pude analisar dados de mais de um bilhão de corridas.

Os dados mostraram que, em Nova York, as reclamações feitas à Comissão de Táxis e Limousines diminuíram enquanto o Uber crescia – mesmo controlando estatisticamente para fatores não relacionados ao Uber, como o clima.


O número de reclamações de clientes por corrida à Comissão de Táxis e Limousines de Nova York começou a cair

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A redução no número relativo de reclamações é consistente com melhorias na qualidade do serviço prestado, mas também pode ser devida a clientes insatisfeitos decidirem migrar para o Uber em vez de formalizar reclamações. Mas dados de Chicago, onde o Uber também ingressou no mercado em 2011 sugerem que ao menos parte da redução está relacionada a um esforço por parte dos motoristas em melhorar a qualidade do atendimento.

Ao contrário de Nova York, Chicago coleta também a natureza das reclamações. Além do número total ter caído desde 2012, como seria esperado em razão da redução na quantidade de corridas, também caíram as queixas nas áreas específicas relacionadas a um empenho em melhorar o serviço. Em particular, protestos sobre carros bagunçados ou condutores falando ao celular no volante tiveram queda no total registrado em Chicago. Comentários sobre ar-condicionado e máquinas de cartão “estragadas”, que podem ser controlados por motoristas e por empresas que mantêm os veículos, também caíram.


Reclamações de clientes dos táxis de Chicago entre 2012 e 2015, por tipo
O aumento de reclamações em 2012 pode ser atribuído a uma nova regra exigindo que nos carros um adesivo de “como estou dirigindo” com o número de telefone para reclamações

O aumento de reclamações em 2012 pode ser atribuído a uma nova regra exigindo um adesivo de “Como estou dirigindo?”, acompanhado do número de telefone para reclamações


Na maior parte das profissões, aumento de qualidade pode gerar mais negócios, tanto por atrair novos clientes ou por fidelizar os existentes. Mas na indústria de táxis é diferente: uma interação entre um motorista e um passageiro é, normalmente, um negócio isolado. O passageiro acena para o primeiro táxi que passar; o condutor dificilmente consegue demonstrar um que não está falando no telefone. A natureza de interação isolada dilui o incentivo para melhorar atributos que o passageiro não pode observar antes de embarcar. O incentivo, então, pode vir por desejo de uma gorjeta maior, para compensar uma redução na demanda ou (menos provável) por interesse em evitar prejudicar a reputação geral dos táxis.

É óbvio que consumidores que usar Uber, Lyft ou outras companhias de carona preferem seus serviços aos táxis normais. Não fosse assim, eles não migrariam cada vez mais para essas empresas. Mas minha análise sugere que mesmo consumidores que continuam usando táxis normais estão colhendo algumas melhorias. Legisladores seriam sensatos em levar isso em consideração ao responder ao lobby de taxistas contra seus novos competidores, uma vez que acabar com esses novos serviços pode resultar em os taxistas voltarem às suas velhas maneiras.

Artigo de Scott Wallsten, publicado originalmente na The Atlantic, com tradução Vicentte Jalowitzki de Quadros.
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