A busca por uma filantropia eficiente tem sido de fato muito boa para as pessoas. O uso do método científico para avaliar o impacto social de doações esclareceu as causas primárias do sofrimento humano, enquanto a pesquisa científica financiada por essas doações conseguiu enfraqueceu urgentes ameaças para à civilização, senão à própria humanidade. No entanto, acredito que um altruísta realmente interessado em melhorar o mundo não deve esquecer que o alívio do sofrimento imediato e a defesa da humanidade contra catástrofes estão intimamente ligados ao crescimento econômico.

Acredito que analisar as consequências do crescimento econômico é importante para altruístas interessados na eficiência de sua solidariedade. Mais especificamente, acredito que altruístas efetivos deveriam se concentrar na defesa de cidades livres como um mecanismo para melhorar a governança e promover o crescimento econômico. Uma cidade livre é uma cidade com grande autonomia institucional do país onde fica, como por exemplo, Hong Kong.

É difícil negar a importância do crescimento econômico sustentável. A humanidade, na maior parte de sua história, viveu na pobreza. Imagens hoje associadas com a África Subsaariana rural eram a norma para a maioria dos nossos ancestrais. Apenas recentemente, após a Revolução Industrial, um número crescente de pessoas passou a ter condições de sobreviver dignamente.

O crescimento econômico não se reverteu instataneamente em desenvolvimento econômico, mas foi lentamente melhorando as vidas daqueles que o experimentavam. A riqueza criada por esse processo então se transformou em vacinas, alfabetização universal, nascimentos seguros – tanto para mãe quanto para o filho -, água limpa, eletricidade, e virtualmente todos os benefícios dos quais hoje as pessoas desfrutam naturalmente.

Crescimento econômio é também responsável pelo maior caso de história humanitária desde a Segunda Guerra Mundial, a ascensão da China. O Banco Mundial estima que o crescimento da China tirou 500 milhões de pessoas da pobreza. Isso significa uma redução no sofrimento das pessoas muito maior do que todos os esforços de doações humanitárias do Ocidente.

 

Além de o crescimento econômico ser responsável pelo padrão de vida que as pessoas têm hoje, economistas tem uma ideia razoável sobre as condições necessárias para o crescimento, isto é, direitos de propriedade privada, efetividade da lei, e a provisão de bens públicos. Países com essas três condições podem crescer rapidamente, escapando da pobreza em uma geração, e fazendo parte dos países desenvolvidos em duas. Cingapura e Hong Kong, por exemplo, deixaram de ser duas ilhas empobrecidas com um PIB per capita de 500 dólares em 1960, para se transformarem nas grandes cidades mundiais que são hoje.

A ascensção dos Tigres Asitáticos ilustra a diferença entre  crescimento e efeitos de políticas imediatas. Eliminar a Malária, por exemplo, salvaria milhões de vida e diminuiria fortemente o sofrimento humano, um objetivo válido. No entanto, eliminar a Malária não levaria a um crescimento até o nível dos desenvolvidos. O PIB per capita talvez até dobre, ou mesmo triplique, mas a África Subsaariana continuaria pobre para os padrões modernos. O crescimento econômico, por outro lado, acabaria com o gap de renda, assim como posteriormente ajudaria a reduzir a Malária e outras doenças perigosas. A Europa eliminou suas doenças, varíola e pólio, após ficar rica, não antes.

Infelizmente poucos, senão nenhum altruísta efetivo está discutindo crescimento econômico. Ao invés disso, estão focados no redução de curto prazo do sofrimento humano, como redes de malária, por exemplo, e na redução da probabilidade de ameças à vida humana. Essas são ambas causas válidas, mas não deviam ser parte de todo o esforço dos altruístas efetivos.

Uma velha piada sobre economistas também explica por que altruísmo efetivo escolheu essas causas. Um economista, Smith, perde sua chave em um beco escuro. Adam, seu amigo, acha ele lá, procurando sob uma luz da rua. Adam pergunta a Smith: “você perdeu sua chave aqui?”, Smith responde: “Não”. Adam então pergunta: “Por que você está procurando aqui, se você perdeu sua chave em outro lugar do beco?”, e Smith responde: “Porque aqui é onde tem luz.

A piada ilustra que economistas, e eu acredito que altruístas efetivos também, tendem a focar em problemas facilmente mensuráveis. Calcular os anos de vida ajustados por uma intervenção é relativamente simples. Se a prevenção da Malária funcionar, haverá X menos mortes infantis, e Y menos crianças doentes. Isso pode ser comparado a uma diferente caridade, a construção de casas para os sem teto na América. Tirar os sem teto das ruas pode salvar Z vidas por ano. Se $100.000 salvam quinhentas crianças da malária, mas apenas cinco sem tetos, a prevenção da malária é um custo mais efetivo em reduzir o sofrimento humano.

Ameaças à vida são similarmente fáceis de quantificar. Ignorando a população futura, uma ameaça à existência poderia matar sete bilhões de pessoas. Mesmo se a probabilidade dessa ameaça for 0.1, reduzir essa probabilidade a 0 salva o equivalente a 7 milhões de vidas.

O crescimento econômico, por outro lado, é muito mais difícil de quantificar. Quais são os benefícios de uma campanha anti corrupção? Os efeitos de curto prazo, o uso mais eficiente dos recursos governamentais, podem ser quantificados. Mas e os efeitos de longo prazo? E se uma campanha anti corrupção aumentar a confiança no governo, o que por sua vez aumenta o investimento em bens públicos, que abre mercados e gera crescimento econômico. Se já é difícil estabelecer os links causais, quantificar é impossível.

Similarmente, imagine que um país reduz as barreiras para a entrada de novos negócios. Esse novo ambiente vai aumentar a produtividade. No entanto, os negócios antes estabelecidos que tinham o monopólio podem reagir minando o governo. O resultado é difícil o suficiente para racionalizar ex post, prever então é impossível. A dinâmica da governança da maioria dos países é suficientemente complexa e qualquer tentativa de quantificá-la é quase inútil.

Isso, é claro, não significa que nenhuma atenção deveria ser direcionada às questões de governança. No entanto, é importante reconhecer que nem todos os problemas são explicáveis através de experimentos aleatórios com grupos de controle, ou por simples experimentos mentais. A complexidade adicional das questões de governança necessita mais atenção, não menos.

Tendo isso em mente, eu gostaria de argumentar que cidades livres são um dos melhores mecanismos para melhorar a governança, e, por consequência, promover crescimento econômico. A maioria dos economistas aceitaria as afirmações feitas anteriormente sem muita controversa. Já os próximos argumentos não são tão consensuais. Mesmo assim, eu acredito que a criação de cidades livres é uma das maneiras mais importantes e pouco apreciadas de reduzir a pobreza e o sofrimento humano.

Uma cidade livre tem grande autonomia institucional do país em que está. Autonomia que inclui independência comercial e um sistema regulatório independente. O melhor exemplo atualmente é Hong Kong, que é governada por um sistema diferente da China continental. Cidades livres são uma maneira de melhorar rapidamente a governança em partes de países mal governados.

Como previamente mencionado, tanto Hong Kong quanto Cingapura experimentaram rápido crescimento econômico nas últimas cinco décadas. Shenzhen é outro exemplo similar, deixando de ser uma vila pescadora de 30 mil pessoas para se transformar uma área metropolitana de mais de 18 milhões de habitantes. Seu crescimento é principalmente devido à sua designação inicial de ser uma zona econômica exclusiva, legalizando investimento direto na China pela primeira vez na atualidade. Além disso, 30 anos atrás Dubai era um deserto. Agora, é uma metrópole em pleno boom, pois criou um sistema de governança que encoraja o investimento econômico e crescimento.

No entanto, melhorar a governança é difícil. Um razão disso é que qualidade de governança existe por uma razão. Por exemplo, tentar reduzir o poder dos monopólios vai causar retaliação dos monopolistas. Outra razão configura no fato de que pedir para governos melhorarem a si mesmos é como pedir a um carvão para virar diamante. Um país sem histórico de boa governança nao vai ser capaz de se comprometer com a boa governança no futuro.

Enquanto pessoas costumam pensar nos governos como uma única entidade, é mais analiticamente útil considerá-los uma rede complexa entre diversos grupos de interesses – incluindo a burocracia estatal. Esses grupos de interesses apoiam o poder imcumbente em troca de rendas, por exemplo, advindas de privilégios monopolísticos, informação privilegiada e restrição de competição. Melhorar a governança removendo essas rendas vai gerar retaliação por parte desses grupos. Por exemplo, professores mexicanos recorreram à greve quando foi aprovada uma lei banindo a possibilidade de eles venderem suas posições profissionais de ensino.

Mesmo se assumíssemos que nenhum grupo de interesse quisesse bloquear melhoras na governança, ainda haveria problemas para implementar esse processo. Por exemplo, se uma nova agência é criada para combater a corrupção, quem vai policiar tal órgão? Los Zetas, um cartel mexicano, nasceu de um grupo de comandantes do exército mexicano. Nos anos 90, Los Zetas perceberam que os carteis pagavam melhor e se desligaram das forças armadas, se juntando o Cartel do Golfo.

Cidades livres podem ajudar a transpassar ambas dificuldades citadas acima. Primeiro, por ser construída em uma terra desocupada, a cidade livre pode evitar batalhas com grupos de interesse já estabelecidos. Segundo que, por trazer um grupo dedicado ao crescimento econômico, uma cidade livre pode garantir implementação rápida e eficiente de governança.

Há dois tipos de cidades livres, as cidades “charter” e as cidades proprietárias. As primeiras são originárias das ideias de Paul Romer, e governadas pelos países desenvolvidos. As últimas são um termo de minha autoria para descrever cidades privadas, com autonomia institucional. As duas ideias são similares, pois em ambas há o mecanismo de introdução de uma boa governança para propulsionar o crescimento econômico. As ideias diferem em quem seria responsável pela governança.

Países desenvolvidos têm um histórico de boa governança, fazendo deles um pilar confiável de governança. Companhias privadas, por outro lado, têm menos experiências desse tipo, mas se elas fossem proprietárias da terra na qual a cidade seria construída, elas teriam um incentivo para promover desenvolvimento econômcio para aumentar o valor da terra. Governança privada também é mais disseminada do que se imagina, em resoluções de disputa por comércio internacional, por exemplo.

Uma das vantagens das cidades livres da alternativa de altruísmo efetivo consiste na ideia de que, as primeiras, uma vez colocadas em prática, podem pagar por elas mesmas. Construir uma vidade livre nao seria caridade, mas investimento. A arrecadação pelas taxas de uma cidade livre bem sucedida poderia facilmente cobrir o capital inicial.

Além disso, cidades livres podem melhorar a governança no país-sede, para além do seu próprio território. A Chima, após perceber o sucesso de Hong Kong, criou quatro zonas econômicas exclusivas. Após o sucesso dessas zonas, mais foram criadas. Hong Kong e Shenzhen não apenas retiraram seus residentes da pobreza. Eles mostraram para o resto da China o impacto que a melhora da governança poderia ter. Essas melhorias foram então adaptadas para o resto da China, criando a economia chinesa que nós conhecemos hoje.

Por fim, cidades livres são viáveis atualmente. A barreira primária não é a tecnológica, mas política. Países não estão dispostos a abrir mão de suas autoridades. Mesmo que cidades livres possam ser construídas em terras inabitadas. Escolher viver em uma cidade liver seria estritamente voluntário.

Por sorte, as barreiras políticas estão lentamente caindo. Madagascar considerou construir uma cidade “charter”. No entanto, Marc Ravalomanana, o presidente, foi tirado do poder antes que a visão de Romer pudesse ser implementada. Honduras criou um aparato legal para criar cidades livres, as chamadas ZEDEs (Zonas de Emprego e Desenvolvimento Econômico). No entanto, a implementação do aparato ficou parada.

Capital privado também existe para a construção de uma cidade livre. A Cidade Econômica King Abdullah, na Arábia Saudita, foi a primeira cidade a ser registrada em uma Bolsa da Valores, é estimada em 86 bilhões de dólares. O Distrito de Negócios Internacionais Songdo, na Coreia do Sul, é estimada de 40 bilhões.

É claro que cidades livres podem falhar, há inúmeros fatores que poderiam faze-la dar errado. Por outro lado, crescimento econômico sustentado é a melhor ferramenta anti pobreza que a humanidade conheceu em sua história. Cidades livres poderiam tirar milhões, se não centenas de mulhões da pobreza no próximo século pela melhora de governança. Por esta razão, eu acredito que altruístas efetivos poderiam adicionar as cidades livres às causas que defendem.  

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