O famoso biólogo Richard Dawkins esteve no Brasil há alguns dias, participando do evento Fronteiras do Pensamento, em Porto Alegre, concedendo entrevista à Revista VEJA, conhecendo muitas pessoas e tirando muitas selfies.
Apesar de tudo isso, um outro fato chamou mais atenção do que o esperado. Após sofrer um acidente no caminho para o avião que o levaria de São Paulo para Los Angeles, cortar o rosto e ter de ir ao hospital, ele soltou a seguinte declaração:
“Fiquei impressionado como houve pouca espera. Minha experiência britânica me preparou para longas horas na emergência”
A surpresa foi tanta que até a página do Partido dos Trabalhadores (PT) no Facebook fez questão de registrar a declaração e atribuí-la a uma suposta eficiência do SUS sob a gestão petista.
A primeira questão que veio à mente de alguns, ao ler a notícia, foi: Será que ele foi realmente atendido pelo SUS?
Não consegui a confirmação em lugar algum. Mas lendo suas cartas e todos os comentários sobre, como não há nada especificando pagamento pelo atendimento, acredito que ele tenha sim sido atendido pelo SUS. A segunda questão foi: Será que ele não foi atendido com tamanha eficiência por ser “gringo”? Talvez. Mas não temos como saber.
Portanto, assumo as premissas de que ele foi atendido pelo SUS e que o bom atendimento que teve foi pelo bom funcionamento da emergência em que esteve, não porque ele ser quem é.
Assumindo essas premissas, parto para minhas perguntas: Esse caso prova que o SUS é eficiente? E mais, esse caso prova que a saúde pública brasileira é melhor que a britânica?
Exemplo do dia-a-dia do SUS
Segundo o Datafolha, em pesquisa encomendada pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), mais de 90% dos brasileiros está insatisfeito com o sistema de saúde brasileiro. A maioria das reclamações se dão na demora para a marcação de consultas e exames.
Muitos culpam esses números em falta de verbas. Costumam comparar o gasto por pessoa do SUS com o de países desenvolvidos e batem o martelo de que o SUS não é bom pois o governo não gasta o suficiente.
A primeira parte, de que o SUS gasta menos por pessoa que o sistema de países desenvolvidos é verdade. Porém, comparar apenas o gasto com saúde é equivocado. Como a renda per capita (por pessoa) em países desenvolvidos é maior, esses países gastam mais (em termos absolutos) em praticamente tudo, desde saúde, até educação, segurança, esporte, ciência e tecnologia, etc. Com isso, como o “problema” não é exclusivamente da saúde, a saída não é aumentar os gastos em saúde (que diminuiriam os gastos com todo o resto), mas sim descobrir como aumentar a renda per capita brasileira, permitindo assim, que governo e famílias tivessem mais dinheiro para gastar em todas as áreas.
O Reino Unido também tem seu Sistema Único de Saúde (SUS), ele se chama National Health Service (NHS). O sistema, que na realidade não é “único”, como o SUS, mas sim dividido em quatro, foi criado na década de 40, durante a ascensão do Welfare State na Europa do pós-guerra.
Indo direto ao ponto, a média de gastos por pessoa pelo governo britânico no NHS inglês é de £1.912 por ano (2013), ou, em reais, R$9117. No Brasil, o SUS gasta em média R$954 (2013), ou seja, pouco mais de 10%, em termos absolutos, dos gastos ingleses.
Como o dito, essa comparação é suficiente para afirmarem que o governo brasileiro gasta pouco e que a solução seria aumentar os gastos com saúde para que a qualidade da saúde aumentasse.
Porém, a declaração de Richard Dawkins, ao invés de reforçar essa ideia, na realidade ajuda a falseá-la.
Se num país que gasta 10 vezes mais que o Brasil com saúde a regra, segundo Dawkins são “longas horas na emergência”, o que faria alguém pensar que aumentar os gastos no Brasil diminuiria a espera por atendimento?
Dawkins, entretanto, se referia à emergência, no que se refere a tratamento, dos pacientes esperando por tratamento, 216 mil esperavam por mais de 4 meses e 70 mil por mais de 6 meses. Infelizmente, o NHS não fornece o tempo médio, mas com um gasto dez vezes superior ao brasileiro, deixar quase 300 mil pacientes que precisam de tratamento esperando na fila por meses não é um perfeito exemplo de eficiência.
No setor privado, em regra, quanto mais clientes você atende, maior a sua receita (orçamento) e, em regra, maior o seu lucro. Isso incentiva tanto hospitais, quanto funcionários a atenderem o maior número de pacientes possível. No setor público, por outro lado, a receita (orçamento) é definida a priori, pelo processo político, e boa parte dos gastos independe da real demanda do cidadão por saúde no local.
O exemplo de Tutóia mostra bem como o governo consegue ser o pior alocador de recursos possível, fazendo com que falte materiais básicos em um hospital e tendo excesso de estrutura em outro hospital, onde não há demanda.
Tutoia e a má alocação de recursos
Ao invés de dar ao governo, por meio de políticos e burocratas, o poder de tomar o seu dinheiro e decidir por si como gastá-lo, construindo hospitais que são notadamente ineficientes e mal administrados, por que não desestatizar e descentralizar o sistema, mudando o papel das políticas públicas de controladoras e financiadoras dos produtores (médicos, enfermeiros, etc) para auxiliadoras e financiadoras dos consumidores (cidadãos)?
Ao invés de ser dono de hospital, gastando bilhões com isso, o governo brasileiro poderia ter como meta o aumento da cobertura dos cidadãos brasileiros por planos de saúde e desburocratizar o setor, extremamente regulado pela ANS e por leis absurdas.
A escolha, por meio do cidadão de seu próprio plano, sempre será uma solução melhor, mais barata e mais eficiente que o controle total por um ente gigante e corrupto da saúde de todos nós e de nossas famílias.
Mais liberdade de escolha, menos ministério da saúde.
As 3 cartas de Richard Dawkins sobre sua visita ao Brasil podem ser lidar aqui, aqui e aqui.