Todo brasileiro, governista ou não, sabe que o governo de Dilma Rousseff vem sofrendo severas críticas há um bom tempo – seu índice de reprovação atingiu o ápice nos últimos dias, chegando a 65% (contra míseros 10% de aprovação). E todo brasileiro, governista ou não, deve saber que muitas dessas críticas são justas e merecidas: conivência com crimes de companheiros de partido, fracasso na economia, cortes em programas sociais, obras sem conclusão… Todo brasileiro sabe.

Mas dentro desse cipoal de julgamentos, existe algo translúcido. Os adjetivos de insatisfação dispensados à presidente se referem, muitas vezes – muitas vezes –, à sua condição feminina. Puta, rapariga, vagabunda… E não é só isso. Referências às suas características físicas – como os dentes – deixam claro que ter “defeitos” na aparência é muito mais difícil e significativo para uma mulher do que para um homem. As brincadeiras em relação ao seu corpo não têm fim. Um chefe de Estado covarde nunca teve sua sexualidade tão discutida quanto ela, por ter fama de durona.

Dilma sabe disso tudo. Em entrevista ao The Washington Post, nesta quinta-feira (25), ela afirmou acreditar na existência de um “viés de gênero” nas avaliações que sofre; dizendo ser definida como “uma mulher de personalidade forte que põe o nariz onde não é chamada e que é cercada por caras boa pinta”. Numa reflexão honesta, é difícil imaginar os mesmos comentários em relação a uma autoridade masculina, até porque, em termos de proporção, não há tantas mulheres assim ocupando cargos de poder próximos à presidência, principalmente antes da era Dilma. Não é impossível, porém, que ela tente utilizar esse problema como um fator atenuante para sua reprovação massiva. Mas o sexismo ainda está lá – na verdade, está bem aqui.

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Não é nada pessoal. Não é especificamente contra a pessoa Dilma Vana Rousseff. Mas é a favor da ideia de que a mulher carrega a obrigação de ser bonita, delicada, frágil e muda – menos na cozinha ou na cama. Ideia que não se manifesta pelo nome original, cuja perniciosidade é tão discreta que penetra até a cabeça de outras mulheres. A sociedade ainda é machista.

Toda mulher, ainda que seja contrária ao governo da presidente, deve se revoltar ao ouvir frases sexistas contra Dilma. A ofensa é a todas nós. Porque é exatamente esse o comportamento que perpetua as convenções que oprimem a liberdade feminina para ser pulso firme, não ter dentes perfeitos, usar as roupas que nos convêm, falar o que vem à mente e caminhar na rua sem ser intimidada. Na semana em que a vida de uma garota de 19 anos foi ceifada por um crime de machismo, não se pode esquecer que esse é um assunto sério. Ele gera violência, infelicidade e atraso.

Machismo mata. E disso, por mais incrível que pareça, muita gente ainda não sabe.

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