Por Thiago de Araújo
Há alguns dias completaram-se 22 anos de um dos episódios mais lamentáveis da história do país: o massacre do Carandiru.
No dia 02 de outubro de 1992, após uma discussão entre presidiários do pavilhão 9 do maior presídio de São Paulo, aproximadamente 300 policiais militares invadiram o local e assassinaram, em poucas horas, 111 detentos, todos desarmados. Outros 110 ficaram feridos, e esses são só os dados oficiais.
Após o episódio, uma parte do prédio foi demolida.
Os fatos falavam por si, e as autoridades da época afirmaram categoricamente: aquele acontecimento significava muito mais do que a destruição de um prédio, mas o reconhecimento de que o sistema carcerário brasileiro fracassou.
Sim, fracassamos. As autoridades acertaram na análise. Mas e agora, 22 anos depois? O que fizemos? Que tipo de lição essas mortes nos deixaram?
O massacre se deu dois anos depois da entrada em vigor da Lei 8.072/1990, a famosa e celebrada Lei de Crimes Hediondos. Acreditava-se, à época, que era necessário maior rigor no trato da criminalidade e que os “bandidos” brasileiros possuíam muitas regalias, o que estimulava a prática de novos crimes.
Aprovada a lei, então, era de se esperar uma diminuição na quantidade de delitos graves.
No entanto, segundo dados do Ministério da Justiça, a população carcerária brasileira, em termos relativos, triplicou: o número de presos por 100 mil habitantes passou de 87,87 para 269,79. Em termos absolutos, nós nos tornamos a terceira maior população carcerária do mundo em 2014.
E, por outro lado, a criminalidade também aumentou. As favelas se consolidaram como verdadeiros feudos “dominados” por grandes chefes do tráfico de drogas, e o número de homicídios cresceu consideravelmente em quase todas as capitais do país. A violência urbana, que era um problema sério, tornou-se mais ainda uma questão de guerra, de vida ou morte.
Os números são claros: não só fracassamos há 22 anos, mas continuamos apostando no fracasso. Continuamos alimentando a ideia de que é preciso encarcerar mais, torturar mais, matar mais. Carandiru é repetido em Pedrinhas, no Aníbal Bruno, no Brasil inteiro. E esse fracasso continua matando, dentro e fora dos presídios: mata a “eles”, que são pessoas como “nós”; e mata a “nós”, que somos pessoas como “eles”.
É preciso dar um basta. É preciso menos encarceramento. Quantos Carandirus serão necessários para nos convencermos disso?
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Thiago de Araújo é graduado em Direito pela UFPE. Apaixonado pela luta em favor dos direitos humanos, especialmente na questão carcerária, atualmente sonha em ser defensor público. Enquanto não alcança o objetivo, visita os presídios de Pernambuco para conhecer, de perto, a realidade por trás do senso comum.