A briga em torno de uma nova constituição e constituinte não é a única coisa relevante acontecendo na Venezuela. Um cenário de catástrofe é formado por muitas cenas, algumas desconexas à primeira vista. As que aparecem nos jornais são apenas um último capítulo.
Os olhos de todo o mundo se viraram para a Venezuela com a recente eleição de uma nova constituinte. A constituição atual esteve entre as principais causas que aglutinaram militantes na ascensão de Hugo Chávez, talvez a principal. Maduro parece regido por uma lógica própria, com mais atenção à sobrevivência política do que a qualquer ideia.
Há ampla oposição ao presidente na população, já expressa em eleições e protestos. A crise econômica que vive o país é ainda pior que a brasileira: em 2017, a renda venezuelana deve encolher 7%, enquanto a inflação ficará em 700% e 2000% nesse e no próximo ano, respectivamente.
É uma situação que talvez guarde alguma semelhança com o Brasil, como admitiram PT e PC do B em sua defesa da ditadura local. Com uma diferença: comparada com a crise do chavismo, a nossa foi brincadeira de criança – e deve ser a única forma de chamar a situação brasileira de “brincadeira”. Você deve entender por que até o fim destas linhas.
Se você observar com atenção o mapa acima, com as rotas internacionais sulamericanas, é difícil não notar o espaço vazio na Venezuela. Esse ‘apagão aéreo’ é um bom exemplo do ciclo vicioso entre crise econômica e política. A aviação internacionalmente está encolhendo a passos largos no país.
Recentemente, oito companhias aéreas decidiram parar ou já pararam a sua operação venezuelana: Aeroméxico, Air Canada, Alitalia, Latam, Lufthansa, United Airlines, Avianca e Delta. A Venezuela está em crescente isolamento do resto do mundo, seguindo na rota do que os especialistas chamam de Estado pária, uma nação estranha ao mundo.
(Para saber mais sobre o ‘apagão aéreo’ venezuelano clique aqui)
Em 2016, deveria ter ocorrido eleições para governador na Venezuela. A Comissão Nacional Eleitoral (CNE), no entanto, vem adiando o que seria o primeiro pleito relevante desde que a oposição ganhou maioria no legislativo.
A mesma CNE atuou também para impedir que a oposição viabilizasse por abaixo-assinado um plebiscito que acabaria com o mandato de Maduro, o que é previsto na constituição local. A CNE travou o processo de diversas maneiras, especialmente alegando fraude nas assinaturas.
Hace 9 meses y 14 días 7 jueces suspendieron el revocatorio a Maduro por supuesto fraude en recolección de firmas. Aún buscan las pruebas
— Eugenio G. Martínez (@puzkas) 8 de agosto de 2017
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Por la “investigación” que se inició hace 9 meses y 14 días en 7 estados, es que el CNE le prohibe a la MUD postular en esas entidades
— Eugenio G. Martínez (@puzkas) 8 de agosto de 2017
Em processo kafkiano de perseguição política, a CNE impediu candidaturas da MUD (Mesa da Unidade Democrática, principal partido de oposição) e prometeu investigar se as fraudes eram reais. O chavismo não tem o menor interesse em concluir a investigação.
(Para saber mais sobre o imbróglio das eleições estaduais venezuelanas clique aqui)
(Para saber mais sobre o processo de assinaturas para o revocatório clique aqui)
Em função das eleições para a constituinte, o governo americano lançou uma dura nota criticando as ações de Caracas. Não só isso, ampliou as sanções a peças chaves do governo chavista, incluindo o próprio Maduro. Ou seja, indivíduos e empresas serão punidos pelos Estados Unidos se fizerem qualquer tipo de negócio com o presidente venezuelano e diversos outros membros da sua burocracia. Não há uma sanção contra o país em si, como ocorre com Cuba.
Diosdado Cabello e Marco Rubio já chegaram a acusar um ao outro de narcotraficantes, no Twitter. Cabello é um dos políticos mais importantes da venezuela, amplamente considerado como ‘número dois’ na hierarquia chavista. Rubio é senador e foi um dos candidatos que chegou mais longe na disputa contra Trump pela nomeação do Partido Republicano em 2016.
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Narco Rubio, alias @marcorubio, lo peor de la política imperial, aparece como el defensor de los terroristas que atacaron Fuerte Paramacay.
— Diosdado Cabello R (@dcabellor) 6 de agosto de 2017
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.@dcabellor alias Diosdado”Pablo Escobar” Cabello is unsually nervous & frantic this morning. https://t.co/Ho2oNlczoB
— Marco Rubio (@marcorubio) 6 de agosto de 2017
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(Para saber mais sobre as sanções americanas contra Maduro veja aqui)
Os fatos mencionados exemplificam um cenário real de crise humanitária. As principais organizações de direitos humanos concordam com essa avaliação.
Human Rights Watch e Anistia Internacional, em relatórios recentes sobre a Venezuela, apontam:
Sob a liderança do Presidente Hugo Chávez e agora Presidente Nicolás Maduro, a acumulação de poder no executivo e a erosão de garantias de direitos humanos permitiram ao governo intimidar, perseguir e até mesmo processar criminalmente os seus críticos.
Falta severa de remédios, material médico e comida se intensificaram desde 2014 e a fraca resposta governamental enfraqueceu o direito dos venezuelanos a saúde e comida. Protestantes tem sido arbitrariamente detidos e sujeito a abuso pelas forças de segurança
(Trecho do relatório anual do Human Rights Watch, tradução livre. Para ver o relatório completo clique aqui)
Defensores dos direitos humanos e jornalista lidam com frequentes campanhas de descrédito e ataques e intimidações.
(…)
A saída do país da jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos (em efeito desde 2013) continua a negar as vítimas de violações de direitos humanos e os seus familiares o acesso à justiça, a verdade e a reparação.
(Trecho do relatório anual da Anistia Internacional, tradução livre. Para ver o relatório completo clique aqui)
Assim, o processo de autoexílio e de busca de refúgio tem se intensificado, tornando-se uma preocupação nos seus dois principais vizinhos: Colômbia e Brasil.
(Para saber mais sobre a crise humanitária na Venezuela é melhor ler os dois relatórios já mostrados)
(Para saber mais sobre os venezuelanos saindo do país, clique aqui, aqui e aqui)