Por Valdenor Júnior
A melhora da condição dos trabalhadores é um processo histórico relacionado ao crescimento em prosperidade dos países e do mundo em geral. Como nos diria Alex Tabarrok,
“Quanto maior for a produtividade do trabalhador e maior suas renda, menos o trabalhador vai querer vender direitos por salários maiores (…). Trabalhadores ganham mais autonomia conforme eles e sua sociedade ficam mais produtivas. Então, o melhor protetor da autonomia dos trabalhadores é maior produtividade e crescimento econômico. (O melhor protetor não é o único protetor, sindicatos também podem servir a um propósito útil nesse sentido como também acionistas e departamentos de recursos humanos.)”
Por isso, devemos nos focar em instituições político-legais que aumentem o rol de oportunidades disponíveis, não que tenham por objetivo retirar opções tratadas como necessariamente indesejáveis. O economista Amartya Sen assim se referiu à questão das condições de trabalhadores em fábricas no terceiro mundo em informe para a ONU denominado “Poverty, evil and crime” de 2007:
“Mas na vasta maioria dos casos os empregados estão nesses empregos muito ruins porque eles têm poucas opções – nenhuma das quais são particularmente boas. A falha do governo e da sociedade em criar oportunidades para emprego decente é o principal culpado aqui, o que torna possível recrutar o trabalho para empregos muito ruins, uma vez que as alternativas disponíveis seriam desemprego e fome.”
Não adiantaria proibir essas más condições de trabalho, se as outras opções disponíveis são tão ou mais ruins, isso apenas prejudicaria estas pessoas ainda mais. Isso significa que é melhor focar na criação de novas oportunidades, de melhores opções, e assim por diante. A principal forma de fazê-lo é o governo deixar de atrapalhar o empreendedorismo e a criação de emprego por meio de regulações, burocracias e tributação. Outra é a política social de renda mínima para os muito pobres, como o bolsa-família, que permite recusar condições de trabalho muito insalubres. Uma ideia interessante foi adotada na Dinamarca: diminuiu-se a regulação de proteção do trabalhador (que encarece a contratação de trabalhadores por dificultar a demissão), mas, em contrapartida, aumentou-se o seguro-desemprego e há uma política ativa de reinserção no mercado de trabalho. É a chamada flexigurança, cuja adoção é recomendada pela Comissão Europeia aos outros países da União Europeia.
E a ideia de “compartilhamento de emprego” pela redução compulsória da jornada de trabalho, poderia auxiliar nesta questão? Alguns acreditam que isso poderia aumentar o número de empregos, pois dividiria o trabalho disponível entre mais pessoas. Apesar desse raciocínio parecer intuitivamente correto, ele é enganoso.
Primeiro, deve-se levar em conta que esta é uma regra que retira a opção de trabalhar em uma jornada padrão mais elevada, o que, como já salientamos anteriormente, seria uma abordagem falha em princípio. Em segundo lugar, trago ao leitor de nosso blog um texto muito interessante, contido no livro “Economia do Trabalho” de George Borjas, na página 147, onde este economista especializado em mercado de trabalho apresenta as evidências empíricas de que esta política não beneficia o trabalhador em geral, uma vez que, ao contrário do objetivo pretendido de aumentar as vagas de emprego, sua adoção aumentou o desemprego onde foi aplicada, com foco no caso da Alemanha. As fontes usadas por ele estão todas linkadas e disponíveis para exame dos leitores.
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Compartilhamento de Trabalho na Alemanha
Por George Borjas
Muitos países europeus sofreram grandes taxas de desemprego nos anos 1990. Na França, a taxa de desemprego permaneceu acima de 10% em grande parte da década. Na Alemanha, a taxa tem flutuado em aproximadamente 9% desde 1994. A persistência dessa situação fez surgir a teoria de que o desemprego pode ser reduzido ao compartilhar o trabalho disponível entre os muitos trabalhadores potenciais. Em outras palavras, mais empregos seriam criados se o governo obrigasse uma redução no número padrão de horas consecutivas que o trabalhador típico poderia trabalhar.
Vários países adotaram essa teoria e reduziram a extensão da semana de trabalho padrão. Em 2000, por exemplo, o governo francês obrigou a redução da semana de trabalho de 39 para 35 horas. Na Alemanha, os sindicatos negociaram reduções consideráveis na base de indústria por indústria. Nos setores de metalúrgica e impressão, por exemplo, a semana de trabalho padrão caiu de 40 para 36 horas entre 1984 e 1994.
O conceito de compartilhamento de trabalho traz consequências não intencionais importantes – e poderá reduzir ainda mais a demanda por trabalho – porque ele ignora os fundamentos da teoria econômica. Uma redução na semana de trabalho padrão impõe ainda mais restrições sobre a decisão da empresa de contratar um trabalhador adicional. Afinal de contas, um empregador que planejava usar os novos trabalhadores para uma semana de trabalho de 40 horas, no salário por tempo consecutivo, agora terá de pagar hora-extra depois de 35 horas. De fato, a redução na semana de trabalho padrão poderá, na realidade, aumentar o salário médio associado com a contratação de um novo trabalhador. Como resultado, os empregadores que acham ótimo prover suas fábricas com trabalhadores para um turno de 40 horas descobrirão que a redução obrigatória na semana de trabalho aumentará o custo de contratação de um trabalhador adicional. Assim, eles reduzirão o número de horas exigidas por trabalhador e o número de trabalhadores contratados.
Isso é exatamente o que ocorre na Alemanha. A redução na semana de trabalho padrão reduziu o número médio de horas trabalhadas por semana e aumentou a taxa salarial média – mas o total de empregos declinou. Em outras palavras, o compartilhamento de trabalho manteve a renda relativamente constante para alguns trabalhadores sortudos que permaneceram no emprego, porém, aumentou o número de pessoas desempregadas.
Fontes: Jennifer Hunt, ‘Has Work-Sharing Worked in Germany?“, Quartely Journal of Economics 114 (February 1999): 117-48; veja também Bruno Crépon e Francis Kramarz, “Employed 40 Hours or Not Employed 39: lessons from the 1982 Mandatory Reduction of the Workweek“, Journal of Political Economy 110 (December 2002): 1355-89; e Phillipe Askenazy, “A Primer on the 35-Hour in France, 1997-2007“, IZA Discussion Paper nº 3402, 2008.
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*A imagem que ilustra este artigo é a pintura “Operários”, de Tarsila do Amaral, 1933. Palácio de verão do Governo de São Paulo, Campos de Jordão.
Valdenor Júnior é advogado. Editor no site Mercado Popular. Escreve também para o site internacional Centro por uma Sociedade sem Estado (C4SS), escreveu para o site brasileiro Liberzone, e mantém o blog pessoal Tabula (não) Rasa & Libertarianismo Bleeding Heart. Seus principais interesses são filosofia política liberal, economia mainstream e institucional, ciência evolucionária, naturalismo filosófico, teoria naturalizada do Direito, direito internacional dos direitos humanos e psicologia cognitiva.