Por Tino Sanandaji

Tradução por Pedro Galvão de França Pupo, publicado originalmente aqui

A Suécia é vista como uma utopia igualitária por estrangeiros, mas a realidade é complexa. De algumas maneiras, a Suécia tem menos igualdade social do que os Estados Unidos. Se, por um lado, a classe alta americana é principalmente meritocrática, a classe alta da Suécia ainda é definida em grande parte pelo berço.

Na história da Europa, somente Suécia, Noruega e Finlândia nunca passaram pelo feudalismo (a Dinamarca era mais próxima da Europa continental). A nobreza nórdica era uma parte pequena da população e não era tão poderosa quanto a nobreza na Europa continental, apesar de ainda ser influente. A classe alta na Suécia hoje consiste da nobreza e de famílias burguesas ricas que se uniram socialmente a ela. Famílias burguesas ricas vivem nas mesmas vizinhanças e adotam comportamento e identidade parecidos com os da nobreza. Apesar da antiga predominância da social-democracia, eles continuam sendo um grupo social coerente, com sotaque, vestimentas, valores etc. distintos e fáceis de reconhecer.

Pertencer à classe alta não é somente uma questão de riqueza, e na verdade depende mais da linhagem. Assim como nos tempos antigos, um membro nouveau riche (N.T.: “novo rico”) da classe média não vai ser aceito automaticamente como um membro das classes altas, a não ser que ele busque adaptar seu comportamento para ser aceito socialmente pelas classes mais altas.

As classes altas na Suécia possuem uma parte desproporcional da riqueza e do poder. A nobreza formal na Suécia consiste em aproximadamente 0.2% da população. Alguns anos atrás eu vi uma lista dos suecos mais ricos. 10% dos suecos mais ricos são membros da nobreza. Por outro lado, não havia um único imigrante não-europeu entre eles. Entre os primeiros-ministros suecos da era moderna, 20% pertenceram à nobreza.

A Suécia também é conhecida pela desigualdade de renda. Estudos indicam que a Suécia é um país cada vez mais caracterizado pela alta mobilidade de renda entre gerações. Porém, distribuição de renda não é a mesma coisa que distribuição de riqueza. O que alguns talvez não saibam é que a desigualdade de riqueza é relativamente alta na Suécia. O 1% mais rico é dono de aproximadamente 35% da riqueza nos Estados Unidos. Na Suécia, por causa dos altos níveis de evasão fiscal, o número é mais difícil de calcular. Quando são incluídas estimativas da riqueza mantida fora da Suécia, Roine and Waldenström estimam que o 1% mais rico da Suécia possui 25-40% da riqueza total, não muito longe dos níveis americanos de desigualdade, e crescendo mais rapidamente.

Ao mesmo tempo, a mobilidade das grandes riquezas entre gerações é muito baixa. Um estudo recente descobriu que um assustador 80-90% de desigualdade de riqueza na Suécia é transmitido para a próxima geração!

De acordo com outro estudo, a porção dos suecos mais ricos que herdou sua riqueza é por volta de 2/3, sendo o restante 1/3 de empreendedores, enquanto que nos Estados Unidos é o contrário, com 1/3 dos mais ricos tendo herdado sua riqueza e aproximadamente 2/3 sendo empreendedores.

Portanto, enquanto a classe média sueca é grande e tem uma distribuição de ganhos comprimida (N. T.: próxima à renda média), no topo da pirâmide você tem um número pequeno de famílias aristocráticas controlando grande parte da riqueza. O ingresso de novos membros nesse grupo é raro, provavelmente mais raro do que nos Estados Unidos. Um motivo são as barreiras informais mais fortes entre as classes; o simples ganho de riqueza não é suficiente para ser aceito como um membro da classe alta aristocrática. Outro motivo mais interessante pode ser o efeito colateral de políticas econômicas do Estado de Bem-Estar Social.

Durante a era da predominância dos social-democratas, eles perguntaram-se como lidar com a desigualdade de riqueza. O dilema que os sociais democratas enfrentavam era esse: as famílias de classe alta responsáveis pelos negócios fizeram um bom serviço gerenciando a indústria de exportação sueca, a chave da riqueza da Suécia. Isso é especialmente verdade para a família Wallenberg, a principal família industrial na Suécia, que entre outras empresas controla a ABB, Ericsson, Electrolux, Atlas Copco, SKF, AstraZeneca e Saab e faz um serviço excelente.

Os social-democratas decidiram aceitar a distribuição desigual de bens, mas simplesmente reduzir o valor desses bens usando altas taxas de impostos punitivas. Por causa da inflação alta, impostos sobre o capital frequentemente ficavam entre 80-100%.

As famílias de classe alta ainda eram donas da maior parte da indústria privada, mas, por causa dos impostos, esses bens simplesmente não valiam muito. De maneira paradoxal, os altos impostos e regulações sobre o capital que impediram investimentos financeiros parecem ter ajudado a congelar a distribuição de bens, com a porção da riqueza possuída pelos ricos permanecendo razoavelmente constante entre a década de 70 e a década de 90.

Apesar da Suécia historicamente ter sido um país com altos níveis de empreendedorismo, a política econômica dessa era dificultou o acúmulo de novas riquezas. Das maiores firmas da Suécia, apenas algumas foram fundadas depois de 1970. Obviamente, isso reduz a mobilidade para as classes altas. Enquanto isso, a combinação de pensões generosas e altas taxas de imposto de renda reduz o incentivo da classe média para acumular capital.

Eventualmente, ideias de livre mercado se tornaram populares na Suécia. Isso levou a impostos reduzidos, um ambiente melhor para negócios e aboliu restrições sobre o capital. O resultado foi que o valor dos bens que até então estavam suprimidos explodiu. Entre 1980 e 2000, a bolsa de valores de Estocolmo aumentou por um fator de 56! Os valores de imóveis em áreas afluentes da Suécia também subiram. Quem era dono desses bens? Principalmente a classe alta.

Por razões que eu não entendo plenamente (talvez medo de que os ricos movessem sua riqueza), a Suécia tem continuado a reduzir impostos para quem já é rico, enquanto mantém altos os impostos sobre nova riqueza obtida por trabalho ou empreendedorismo. Em 2005 a esquerda aboliu totalmente o imposto sobre herança. Isso significa que hoje a maior taxa cobrada de alguém que herda sua riqueza é de 0%, e a taxa cobrada de alguém que cria nova riqueza construindo uma nova empresa é de 67%.

A experiência sueca mostra que o livre mercado não é necessariamente o inimigo da mobilidade social. Os social-democratas reduziram a mobilidade para cima obtida por trabalho e empreendedorismo, ajudando a congelar a sociedade de classes em vez de permitir a entrada de novos ares. Não é fácil resolver a desigualdade de riqueza. Talvez uma ideia seja reintroduzir um imposto razoável sobre herança, somente para os ricos, e usar a renda obtida para reduzir os impostos cobrados de empreendedores.

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N.E.: Dados da OCDE também confirmam que a Suécia é bastante desigual em termos de riqueza.

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