A princípio, acho natural que se tente alertar homens dos péssimos hábitos que podem estar ligados a uma visão equivocada do que significa “ser homem”. Sabemos, por exemplo, que homens vão menos vezes ao médico e são mais propensos a tentar e cometer suicídio, em parte por acreditar que não devem se cuidar tanto ou que não deveriam compartilhar seus sofrimentos com terceiros.

Porém, não parece haver uma definição clara do que caracteriza “masculinidade tóxica”. As tentativas de definir o termo acabam em aspectos bem generalistas como é o caso da definição dada por Guilherme Valadares, membro do Comitê #ElesporElas, da ONU Mulheres. Para ele, a noção criada pela masculinidade tóxica “valoriza qualidades como dominância e controle, enquanto despreza aspectos como vulnerabilidade, altruísmo e compaixão, entendidas como sinais de fraqueza e associadas às mulheres”.

Em uma publicação para ajudar a saúde mental de homens e meninos, a Associação Americana de Psicologia acaba cometendo este mesmo equívoco. De acordo com o sociólogo Frank Furedi, a APA considera masculinidade tradicional marcada pelo “estoicismo, a competitividade” e acaba combinando esses valores com “dominância e agressão”. Essa imprecisão da definição do termo acaba levando a uma gama cada vez maior de comportamentos masculinos sendo considerados como tóxicos, mesmo que não necessariamente o sejam.

Os defensores do fim da masculinidade tóxica afirmam que não são contra a ideia de masculinidade em si. Almejam apenas libertar os homens de um conceito muito restrito de “masculinidade”: machão, pegador, competitivo, contrário a demonstrações de afeto e agressivo. Contudo, raramente se propõe o que seria uma masculinidade saudável ou desejável, apenas concluem que homens se beneficiam de características consideradas “femininas”: empatia, cooperatividade e agradabilidade. Às vezes, somente por discordar de um desejo de uma mulher o homem recebe o rótulo de “boy lixo”.

Nos poucos esforços feitos de apontar em uma direção daquilo poderia guiar meninos e homens, essa direção costuma ser descolada da realidade. O caso do Dossiê Brandlab do Google, “A Nova Masculinidade e os Homens Brasileiros”, ilustra bem esse distanciamento. Apesar de mostrar alguns dados relevantes sobre como homens sofrem com masculinidade tóxica, o dossiê falha ao associar a Nova Masculinidade com temas de interesse majoritariamente feminino como moda, beleza e maquiagem.    

Ao ler boa parte do material sobre esse tema, a impressão que fica é que precisamos nos livrar de várias características que sempre consideramos como masculinas e ao mesmo tempo exaltar o maravilhoso mundo da feminilidade. Embora seja óbvio que violência, falta de cuidados básicos com a saúde e assédio sejam comportamentos nocivos, quando se trata de competitividade, propensão a risco e apatia a conclusão não é tão simples. Do mesmo modo, nem sempre compartilhar sentimentos, cooperação e aversão a risco são as posturas adequadas para uma situação.

CEO’s de mega empresas e grandes investidores apenas adquiriram as posições que possuem porque assumiram grandes riscos e entraram na competição. É improvável que alguém consiga inovar e ser disruptivo dentro de um mercado sem essas características. Mesmo as mulheres que almejam esse tipo de carreira terão que abraçar esses atributos – e não há nada de errado nisso.

Por outro lado, há evidências que um estilo de liderança mais cooperativo, “feminino”, pode ser extremamente lucrativo em vários outros setores. Além disso, ao desenvolverem sua capacidade de comunicar emoções e demonstrar empatia, por exemplo, homens tem muito a ganhar nos campos do relacionamento e de qualidade de vida.

Admitir que homens e mulheres são capazes tanto de excelentes feitos como de ações terríveis é o primeiro passo para qualquer discussão saudável sobre os gêneros e seus papéis. Qualquer tentativa de suprimir o que um ou outro tem de melhor a oferecer não só gera ressentimento e, por vezes, violência, como empobrece a sociedade como um todo.

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