Por Valdenor Júnior

Qual será o futuro do liberalismo/libertarianismo no Brasil? Isso depende de muitos fatores, alguns deles internos ao próprio movimento organizado. Aqui, forneço meu ponto de vista sobre quais seriam os desenvolvimentos e estratégias mais interessantes.

Primeiro, penso que o público-alvo seja a juventude. É nessa faixa etária onde mais avanços podem ser obtidos em termos de adesão a um liberalismo consistente, uma vez que as pessoas jovens – via de regra – estão mais propensas a aceitar essas ideias sem precisar encaixá-las em dicotomias defasadas.

Segundo, penso que a consolidação de um movimento social de cunho liberal, por meio de coletivos liberais, à exemplo do Coletivo Nabuco e do Coletivo Sociedade Aberta, seja uma necessidade para a maturação do liberalismo brasileiro.

Há muito que os liberais abriram mão de causas progressistas inerentes à nossa posição, para insistir em uma ênfase desproporcional em questões gerais de política e economia. No Brasil, muitas dessas causas foram assumidas pelos movimentos sociais ligados a vários grupos identificados como de esquerda, tais como o fim da revista vexatória, a demarcação de terras indígenas e quilombolas, a regularização fundiária em favelas, a assessoria aos trabalhadores ambulantes, as causas LGBT e feminista, entre outras questões. É hora de retomar essas bandeiras, e a existência de um movimento social liberal é imprescindível para isso.

A retomada, entretanto, não deve ser vista como uma súbita invasão a um território considerado largamente não-liberal em essência. Essa mentalidade não é o de que precisamos. Se outras pessoas estão defendendo causas sobre as quais deveríamos falar mais e agir mais, e que dizem respeito diretamente ao bem-estar dos mais pobres e das minorias, elas estão defendendo também causas liberais. A ideologia subjacente delas pode ser um problema em outras circunstâncias, mas não quando ela os faz defender causas nas quais estamos em terreno comum.

É nesse sentido que considero que os ativismos mais bem-sucedidos são aqueles que reúnem várias organizações na busca por um objetivo concreto bem definido, sem perguntar pelas ideologias subjacentes, do que aqueles cujo objetivo são “altas causas ideológicas”, onde predomina uma série de comportamentos relacionados mais à sinalização da identidade de grupo (e bem sabemos evolucionariamente a que isso serve…), ao invés da busca por propostas efetivas. Nesse quesito, o Coletivo Nabuco deu exemplo ao sair em defesa dos trabalhadores ambulantes do campus da UFPE, juntamente com outros coletivos da universidade, assinando petição conjunta com os mesmos.

Isso nos leva ao terceiro ponto. Devemos ter propostas concretas – e progressistas – para a vida das pessoas. Mas não considero correto nem eficaz promover ganhos em liberdade em qualquer direção, aleatoriamente. Apesar de ganhos agregados em liberdade (principalmente econômica) sejam revertidos em ganhos agregados de bem-estar, o aspecto distributivo é importante: quanto os mais injustiçados e desprivilegiados dado o status quo vigente estão beneficiando-se desses ganhos?

Em vista disso, penso que as propostas de ganhos em liberdade devem ter uma ordem de prioridade baseada no princípio de que, quem mais sofre com as injustiças e mais é onerado pela falta de liberdade, precisa ser atendido com maior urgência.

Portanto, as propostas devem ser pensadas a partir de uma opção preferencial pelos mais pobres e pelas minorias, buscando reduzir os danos gerados pelo Estado e pelo capitalismo de compadrio (incluindo o populismo econômico irresponsável que, mesmo quando bem-intencionado, o reforça) a todas as pessoas, mas prioritariamente aos mais injustiçados e desprivilegiados. Ou seja, justiça social deve ser nosso objetivo – mas nunca desligado do amor à liberdade alheia.

Em texto anterior para o site, descrevi propostas que representariam esse liberalismo com opção preferencial pelos mais pobres e pelas minorias. Considero que aquelas propostas fornecem um norte interessante para que o movimento liberal brasileiro pense e repense suas prioridades, conquanto a lista não seja fechada nem mesmo definitiva.

Como último ponto, penso que o liberalismo brasileiro não deveria ser conhecido principalmente como a defesa do Estado mínimo (ou de agências de proteção privadas sob uma anarquia de mercado) ou como a defesa do direito de propriedade privada. Nossa ênfase deveria ser o respeito absoluto aos direitos civis e a rejeição absoluta ao capitalismo de compadrio. Reparar injustiças evidentes, prioritariamente aquelas que atingem aos mais desfavorecidos, eis o que espero seja o lema desse liberalismo futuro.


 

10689621_717941321625062_1777277409278026878_n

Valdenor Júnior é advogado e mestrando em Direito. Membro da Human Behavior & Evolution Society.        Escreve para o site Centro por uma Sociedade sem Estado (C4SS) e mantém o blog pessoal Tabula (não)  Rasa & Libertarianismo Bleeding Heart. Seus principais interesses são ciência evolucionária com foco nas  adaptações comportamentais humanas,  naturalismo filosófico, filosofia naturalizada do Direito, direito  internacional dos direitos humanos, filosofia política e economia mainstream e institucional.

Compartilhar