Por Valdenor Júnior

O economista Amartya Sen notabilizou-se por defender uma abordagem de “capabilities” (capacidades) para compreender o fenômeno da pobreza. Sua crítica foi a de que a métrica principal para determinar desenvolvimento era o PIB per capita, também chamado de renda per capita, portanto, um critério que enfatiza a renda dos indivíduos, mas que não levaria em conta de que modo essa renda realmente era capaz de ser convertida em capacidades, isto é, em liberdades substantivas de levar o tipo de vida que a pessoa tem razões para valorizar.

“Existem boas razões para que se veja a pobreza como uma privação de capacidades básicas, e não apenas como baixa renda. A privação de capacidades elementares pode refletir-se em morte prematura, subnutrição significativa (especialmente de crianças), morbidez persistente, analfabetismo muito disseminado e outras deficiências.” (Amartya Sen, Desenvolvimento Como Liberdade, p. 35)

Sen está correto em chamar a atenção para o fato de que nem sempre o incremento da renda é acompanhado por uma inteiramente proporcional melhora nestes outros indicadores, por exemplo, o exemplo do aumento da renda familiar em uma sociedade muito sexista, onde esta melhora na renda pode não converter-se em grande melhora para o acesso à nutrição adequada e educação das meninas da família.

Mas Sen está errado em subestimar a importância do crescimento econômico (medido pelo crescimento da renda per capita) em reduzir a pobreza inclusive no sentido mais direto de “capacidades”, o que o levou a apoiar modelos de baixo crescimento econômico, mas alto gasto social, como o de Kerala. O texto abaixo do correspondente da The Economist demonstra o equívoco de Sen e a importância da justiça social ao estilo do livre mercado, com a maximização da riqueza possuída pelos trabalhadores de menor remuneração, confira:

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Métricas de pobreza: Largura, não profundidade

Por S. H., correspondente em Londres do The Economist, seção Free exchange

[Tradução por Pedro Galvão de França Pupo, texto original aqui]

“Essa métrica de um dólar por dia,” diz Amartya Sen, laureado com o prêmio Nobel em economia, “não leva em conta muitas variáveis que influenciam a conversão de renda em qualidade de vida”. Sen argumenta que se nós simplesmente nos concentrarmos em erradicar a pobreza extrema (viver com menos que $1.25 por dia), nós vamos ignorar males sociais importantes que não estão relacionados com renda. Portanto, ele tem sido um dos principais defensores do desenvolvimento de índices alternativos, como o Índice de Desenvolvimento Humano – cuja edição mais recente foi publicada no mês passado. Mas o quão úteis são esses índices?

O propósito de dados alternativos sobre desenvolvimento e pobreza é olhar além do dinheiro e reconhecer que as pessoas podem ser desfavorecidas em áreas além da renda, tais como nutrição, educação e moradia. O argumento é que o desenvolvimento econômico pode não necessariamente resultar em melhorias nessas métricas não-econômicas. Desnutrição infantil na Índia, por exemplo, tem sido persistente apesar do crescimento econômico rápido do país e da redução impressionante da pobreza extrema. Essa foi a ideia por trás do desenvolvimento do Índice de Pobreza Multidimensional (IPM), que considera dez indicadores de pobreza, incluindo nutrição, mortalidade infantil, saneamento básico, eletricidade, acesso a água filtrada e anos de escolaridade.

Medir essas coisas é útil, mas até que ponto elas retratam números de pobreza diferentes do critério de $1.25 por dia? Apesar de ser mais compreensivo, o IPM na verdade parece ter uma relação estatística com melhorias em renda tão forte quanto os dados sobre pobreza extrema.

Dados recentes da Oxford Poverty and Human Development Initiative (N.T: Iniciativa de Pobreza e Desenvolvimento Humano de Oxford) mostram que a relação entre a contagem do IPM e renda por pessoa é tão forte quanto a relação entre a contagem de pobreza extrema e renda por pessoa. Os gráficos abaixo mostram essas duas relações para 97 países. Obviamente, existe uma associação forte e negativa entre a contagem pelo critério da pobreza extrema e PIB per capita; conforme os países enriquecem é esperado que as rendas dos mais pobres cresça (veja o gráfico da esquerda). No entanto, é notável que existe uma relação parecida, forte e negativa, entra a contagem do IPM e a renda por pessoa (veja o gráfico da direita).

Sem título

Para elaboradores de política pública, os dados indicam que rendas mais altas de fato também se convertem em níveis mais baixos de pobreza multidimensional. Apesar das preocupações dos economistas, o argumento de que a análise da renda ignora muitos fatores não parece ter muito peso. O crescimento econômico portanto pode não ser apenas a melhor maneira de superar a pobreza extrema, mas também de reduzir outros males sociais terríveis em áreas além da economia.

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junior

Valdenor Júnior é advogado. Desde janeiro de 2013, escreve em seu blog pessoal Tabula (não) Rasa & Libertarianismo Bleeding Heart onde discute alguns de seus principais interesses: naturalismo filosófico, ciência evolucionária com foco nas explicações darwinianas ao comportamento e cognição humanas, economia, filosofia política com foco na compatibilidade entre livre mercado e justiça social. Também escreve para o Centro por uma Sociedade sem Estado – C4SS e o Liberzone.

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