A Agência Lupa, a primeira iniciativa de fact-checking do Brasil, recentemente avaliou algumas afirmações do ministro da fazenda, Henrique Meirelles, no Fórum Econômico Mundial em Davos. Entre elas está a duvidosa classificação de que é insustentável que tenhamos vivido um período de isolamento comercial no passado recente. Ouso dizer que não só no passado recente como em toda nossa história. O Brasil é historicamente um país fechado. Ainda não aceitamos que Dom Pedro I abriu os portos.


Em questão de participação do comércio no PIB, o governo Dilma fechou no mesmo patamar que Vargas. Você pode pensar que isso se deve à nosso tamanho. Afinal, somos um país grande, com muitos recursos, não precisamos de integração comercial, certo? Bem, os dados contam outra história. A de que, mesmo controlando por nível de renda, população e tamanho, somos muito fechados ao resto do mundo.

As causas são variadas. Parte do fenômeno é oriundo das nossas astronômicas tarifas comerciais. Tributamos mais do que a média tanto bens primários quanto bens manufaturados, e especialmente os bens manufaturados. Mais ainda na contramão, não diminuímos tarifas depois da crise de 2008, como a maioria dos países do mundo.

Quebrando a proteção por setores mais específicos, conseguimos ver a profundidade da distorção. Em termos de proteção efetiva, alguns bens são taxados em mais de 120%. O resultado é visível nos preços de vários bens de consumo. É muito mais barato comprar carros, roupas, eletrodomésticos e telefones nos EUA do que por aqui.

Também é grave que tentamos impor no passado recente uma série de barreiras não-tarifárias. Ao invés de dificultar o comércio internacional através de tarifas, uma série de políticas de conteúdo nacional e práticas de dumping foram praticadas na última décadas. O reflexo foi uma piora substancial na quantidade de pedidos de medidas retaliatórias na OMC.

A equipe da Lupa cita o volume de Investimento Estrangeiro Direto (IED) no Brasil. Os números de fato parecem grandes. Falar de bilhões de dólares tem esse peso. No entanto, essa métrica em absoluto não faz muito sentido. Ela precisa ser comparada com o PIB, o tamanho da economia de um país ou, pelo menos, com quanto IED está indo para outros países. Quando levantamos essa ponderação, o quadro parece mudar. O Brasil recebe menos IED do que a maioria dos países emergentes, apesar de ser uma das maiores economias dessa categoria.

A agência também citou acordos bilaterais de comércio que assinamos recentemente. De novo, o número em si parece impressionar, mas quando posto em perspectiva, se torna parte de uma história diferente.

De fato, nosso maior momento de entrada em tratados se deu no anos 90, com a criação da Mercosul, não no século XXI.

Você talvez esteja se perguntando: de que adianta a integração comercial? Não queremos somente exportar mais já que importar significa mandar recursos para o exterior? Não, certamente não.  Jamais mandaremos mais recursos para o exterior se não estamos recebendo de fora também. Sendo bem simples: para exportar é preciso importar.

Ademais, jamais exportaremos aviões, aço e outros bem de valor-adicionado maior se não nos integrarmos comercialmente. País algum consegue produzir todos os insumos de bens complexos como esses. A produção de um jato da Airbus, por exemplo, envolve milhares de fornecedores diferentes, localizados em dezenas de países, cada firma fazendo o que sabe fazer de melhor.

Comércio é um motor de difusão de tecnologia, técnicas mais modernas e insumos de melhor qualidade. É o que nos permite entrar nas cadeias globais de valor, cortar custos e sermos mais produtivos. Ele não causa desemprego (somente altera sua composição), e pelo contrário, ao permitir ganhos de escala, especialização e acesso à insumos melhores, gera mais empregos, mais produtivos, com salários melhores.

É absolutamente impensável dar o salto da renda média para o patamar de país desenvolvido sem uma substancial abertura comercial. Como disse Henry George, em tempos de guerra bloqueamos os portos inimigos, em tempos de paz protecionistas querem fazer o mesmo com nós mesmos.

 

 

 

 

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