Descontrole de gastos públicos, excesso de intervenções e aumento de medidas protecionistas estiveram dentre os muitos pecados de Dilma Rousseff. Como medidas para recuperar a economia brasileira, o governo Michel Temer assumiu a presidência prometendo reformas para sanar as contas públicas, diminuir as intervenções e garantir maior abertura do país ao comércio internacional. Entretanto, o Ministro das Relações Exteriores, José Serra, parece discordar de um desses pontos.
Como primeiro ato após sua chegada em Hangzhou, na China, para participar da reunião de cúpula do G20, o Chanceler declarou que o Brasil ser visto como uma das economias mais fechadas do mundo seria Folclore e que o país não seria mais fechado que a média.
O Ministro está correto? Estariam as medidas do governo anterior, que chegou a aumentar os impostos de importação em 100 produtos de uma só vez, dentro da normalidade?
Melhor do que discutir as tarifas sobre o farelo de soja, a soja em grão ou o azeite, é ver como o Brasil se compara com os demais países em termos de importação e exportação em relação ao PIB.
O gráfico abaixo mostra o percentual de importação e exportação de todos os países membros do G20 em relação ao seu PIB. Como podem ver, o Brasil ganha destaque com o último lugar em importações, o penúltimo em exportações e o último lugar geral¹.
Como se nota no gráfico anterior, último lugar não é exatamente próximo à média. O gráfico abaixo demonstra que, na realidade, o Brasil está longe da abertura média do grupo das 20 maiores economias mundiais.
Se a economia brasileira ser fechada é folclore, nós encontramos o Saci de José Serra.
É importante frisar, porém, que essas taxas não são, nem devem ser, o único método de se verificar se uma economia é aberta ou não. Afinal, Estados Unidos e China, os dois maiores importadores e exportadores do mundo em termos absolutos, estão apenas levemente acima do Brasil nesse ranking. Todavia, não deixa de ser curioso notar que o Brasil importa e exporta menos, em relação ao seu PIB, que Cuba, um país cujos ditadores costumeiramente reclamam do bloqueio comercial que o país sofre².
O Brasil apresenta um curioso caso de autoembargo, em que os políticos do próprio país são responsáveis por restringir o comércio dos seus cidadãos com o resto do mundo.
Apesar de muito comum entre políticos, a cultura nacionalista em termos comerciais não se restringe a eles. Alguns empresários exportadores chegaram ao ponto de reclamar sobre a compra de um sapato feita pelo presidente Michel Temer na China.
Algo que talvez os empresários exportadores não saibam é que os maiores exportadores do mundo são, também, os maiores importadores. Para exportar produtos de qualidade, é preciso ter insumos de qualidade, e isso passa por fazer parte das cadeias globais de valor, e não por tentar ser “autossuficiente” e produzir tudo o que se consome. Muitos acreditam que exportar seria positivo, enquanto importar seria negativo, justificando, assim, “incentivos” à exportação, desvalorização do câmbio e medidas protecionistas que dificultam a entrada de produtos no país.
O gráfico a seguir mostra que existe uma forte correlação entre importações e exportações, sugerindo que, se políticos e empresários desejam que o Brasil exporte mais, uma das medidas a serem tomadas é a abertura do país para o comércio internacional.
O Brasil é um país fechado. Enquanto os mais ricos podem ir a Nova Iorque, Miami e Paris fazer compras e fugir de tarifas e regulações protecionistas, quem mais sofre com as restrições são justamente os mais pobres, pois ficam reféns de produtos mais caros e de pior qualidade. Um mundo mais globalizado, com um comércio internacional mais livre, foi uma das grandes causas da diminuição da pobreza no planeta nas últimas décadas. O Brasil deveria se abrir de vez para o mundo e dar um fim às desventuras desenvolvimentistas de autossuficiência, que é o principal motivo de nosso subdesenvolvimento. No longo prazo, ganham todos: consumidores, pelo acesso a produtos mais baratos; e indústrias exportadoras, pelo acesso a melhores insumos, mais produtividade e a maiores mercados. Abrir o Brasil não é Folclore, mas seria Carnaval.
[1] O Brasil está em último lugar geral ao se somar o percentual de importações e de exportações. O gráfico está ordenado com base na taxa de importações, do maior para o menor. Todos os dados são os mais recentes disponíveis na base de dados do Banco Mundial. 2014 para Argentina e Índia, 2015 para os demais.
[2] Apesar do embargo estar sendo relaxado nos últimos anos, os dados mais recentes de Cuba na base de dados do Banco Mundial é 2013, antes das medidas de reaproximação anunciadas por Obama ao final de 2014.