A mais difícil história a se contar é a história do presente. Apesar da abundância de dados e relatos, a ligação emotiva dos observadores com os acontecimentos torna as análises mais turvas – e o trabalho do historiador mais difícil. É por esse motivo que “Mundo em Crise” (Editora UnB, 2014), livro do diplomata e economista político Diogo Coelho sobre a crise financeira internacional de 2009, surpreende tão positivamente.

Diz-se que o Presidente americano Harry Truman uma vez se irritou com seus assessores econômicos que, no lugar de dar uma única resposta para suas perguntas, consideravam todos os lados da questão. Ele dizia querer um economista que lhe dissesse qual o lado certo – e não todos os lados. Mas o relato econômico que vê um só lado, apesar de efetivo na disseminação de sua imagem, não é história econômica: é política.

E, ao fazer um relato da recente crise, Coelho consegue se desprender das análises unidimensionais daqueles que tentam fazer avançar uma agenda política. Àqueles que insistem em dizer que a crise era unicamente um resultado de inovações financeiras como derivativos ou a ganância de Wall Street, o livro mostra que o fenômeno na verdade foi muito mais complexo, envolvendo também países emergentes. Ao acumular títulos da dívida americana, esses países contribuíram para reduzir os juros nos EUA e estimular o alto nível de consumo dos cidadãos americanos durante os anos 2000.

De modo similar, o livro demonstra que os argumentos iniciais que comparavam a crise de 2009 à de 1929 eram baseados em narrativas políticas – e não em elementos factuais. Enquanto em 1929 a renda nos EUA colapsou em 25%, em 2009 essa queda foi de 5%. Em termos internacionais, a reação também foi bem diferente. Em 1929 o mundo se fechou ao comércio internacional, numa escalada protecionista que tornava o uso da violência menos custoso – facilitando conflitos vindouros da segunda guerra mundial. Já na última crise, instituições de governança global como o G-20 fizeram amplo esforço para rejeitar o protecionismo e utilizar dos fluxos de comércio global como método de recuperação econômica.

Na verdade, não se viu no pós-2009 uma mudança de sistema – mas sim mudanças específicas dentro do mesmo sistema. O FMI e o Banco Mundial viram suas reformas internas se acelerarem. Instituições como o G-20 e os BRICS passaram a ter mais relevância. A União Europeia passou a cambalear, embora ainda viva. Mas, apesar dessas mudanças pontuais, o princípio de mercados abertos somado a redes de proteção social e livre comércio internacional continua vigente na maioria dos países.

Há muitos desafios para os países em desenvolvimento no futuro imediato. Entre eles, estão a rejeição do sistema de estabilidade macroeconômica – galgando caminhos das crises latino-americanas dos anos 1980 -, e a amenização os efeitos da vindoura normalização das taxas de juros nos EUA e na Europa – que reverberarão no mundo todo.

Mas, para entender esses desafios futuros, você precisa entender o presente. E, para entender o presente, você precisa entender o passado recente. O livro de Diogo Coelho é um bom começo para esse jornada de entendimento.

Saiba mais

COELHO, Diogo (2014). “Mundo em Crise. A História da Crise Financeira, Seus Impactos nas Relações Internacionais.” Brasília: Editora UnB. Compre aqui.

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