Por Matt Ridley*

Bizarramente, a maioria das políticas instadas pelo movimento ambiental aumentariam a extensão de terra que cada pessoa precisa para sustentar seu estilo de vida.

Para sustentar nosso estilo de vida atual, nós seres humanos necessitamos de 1,4 planeta. Esse é o numero calculado por uma misteriosa organização chamada Global Footprint Network, que define pegada ecológica como “Uma medida da quantidade de terra biologicamente produtiva e água que um indivíduo, uma população ou atividade requer para produzir todos os recursos que consomem e para absorver o lixo que produzem utilizando a tecnologia predominante e práticas de gestão de recursos”. Em resumo, estamos consumindo a comida, o combustível e a fibra da terra a uma velocidade 1,4 vez mais rápida do que eles podem ser repostos.

Na verdade, este número é enganador, quase ao ponto da desonestidade. Mais da metade dele consiste da terra que cada pessoa necessitaria para plantar árvores com as quais absorveria sua própria emissão de carbono. Se for levada em consideração a visão de que podemos cortar emissões, ou encontrar maneiras melhores de isolá-las, ou até mesmo lidar com pelo menos algum aumento, então a pegada diminui e estamos vivendo folgadamente dentro das condições do nosso meio ecológico.

Mesmo se esse número da pegada estiver certo, a questão interessante é se está ficando maior ou menor. Argumentarei que a pegada ecológica da atividade humana provavelmente está diminuindo em um ritmo acelerado e que estamos nos tornando mais sustentáveis, não menos, na maneira de usarmos o planeta. Em resumo, o mais sustentável que podemos fazer, e o melhor para o planeta, é a aceleração da mudança tecnológica e do crescimento econômico.

Espero que tenha conseguido sua atenção. Não acredita em mim? Então deixe-me começar com o meu próprio estilo de vida. Estou sentado em uma casa com aquecimento central, vestindo um casaco de tecido sintético, meias de lã, sapatos de couro e calças e camisa de algodão. Acabei de comer uma tigela de cereal com leite e tomei um copo de suco de manga e maracujá importados.

Você concordará que, em termos ecológicos, esta vida é a mais infame que se possa imaginar. Poços de gás e petróleo, campos de algodão e aveia, pastos de gado e ovelha, pomares de maracujá e manga no mundo todo estão desviando sua produção para mim. Acres e mais acres apenas para sustentar o meu estilo de vida.

Sim, mas suponha que eu desista de tudo isso e decida me tornar um caçador, vestido de pele de animais, possuindo pouco mais do que lenha, ferramentas de pedra feitas em casa, cestos de vime e contas de concha. Caço veados enquanto minha esposa cava a terra à procura de raízes. De quanta terra preciso? A resposta surpreendente é que eu precisaria de cerca de 1.000 hectares, exceto se eu vivesse em uma planície tropical bem irrigada à beira de um fecundo rio, mas mais se eu morasse – como, de fato, moro – onde uma vez foi uma fria floresta boreal de carvalhos. Essa é a extensão de terra que o estilo de vida do caçador requer. Se 6,8 bilhões de nós tentassem viver como caçadores, precisaríamos de 18 planetas (54 se não pudéssemos explorar o oceano). Voltar à natureza seria um desastre para a natureza.

É claro, caçadores-coletores caminham pela terra com passos mais leves do que eu. Mas mesmo os amplamente dispersos caçadores de 50.000 anos atrás causaram muitos danos ecológicos. O registro ecológico de Israel, Turquia e Itália revela que os primeiros seres humanos modernos em torno do Mediterrâneo deixaram de se alimentar de cavalos, rinocerontes, mamutes, bisões e tartarugas e passaram a comer coelhos, lebres, pombos e pequenas gazelas. Razão: eles haviam destruído as espécies de reprodução lenta. Caçadores-coletores causaram espasmos de extinção quando chegaram à Australia, América do Norte , Madagascar e Nova Zelândia.

A característica mais notável da agricultura, quando esta foi inventada 10.000 anos atrás, era o quanto a sua pegada era menor. Os primeiros agricultores precisavam de cerca de dez hectares cada para sustentar seu estilo de vida – um centésimo do que o caçador precisava. Da mesma maneira, a introdução dos combustíveis fósseis há 200 anos diminuiu ainda mais a pegada e interrompeu o desflorestamento: nos anos 1700, a indústria de ferro britânica perecia pela falta de combustível de madeira em uma ilha já muito desflorestada. Um século depois, a Grã-Bretanha estava queimando carvão equivalente à produção de uma floresta do tamanho da Escócia e as árvores estavam se propagando novamente.

Na verdade, de volta ao meu estilo de vida, cada item que eu uso hoje necessita de menos terra para ser produzido do que precisava no passado. Meu casaco sintético veio de um poço de petróleo, enquanto o suéter que eu costumava usar em dias frios como este veio de uma fazenda de ovelhas. A pegada do sistema de produção do tecido sintético – poço, refinaria, fábrica e loja – é minúsculo se comparado com a terra necessária para a criação de ovelhas. Minhas meias, sapatos, camisa e café da manhã precisam de cerca de metade da extensão de terra necessária para serem produzidos do que precisavam antes do surgimento dos fertilizantes sintéticos. Meu aquecimento central a gás precisa de muito menos do que uma fogueira.

Vamos dar uma olhada nos alimentos de maneira um pouco mais detalhada. Quando os campos eram cultivados com bois ou cavalos, que precisavam de pasto, 25% a mais precisava ser reservado apenas para alimentá-los, de acordo com o especialista em energia canadense Vaclac Smil. A introdução do trator reduziu a pegada humana. Nos últimos 50 anos, graças às inovações da genética, os pesticidas e fertilizantes, a quantidade de cereais cultivados no mundo quase triplicou, mesmo que a extensão dos campos de cereal tenha permanecido praticamente a mesma – pouco menos de 700m de hectares.

Se tentássemos alimentar a população atual de 6,8 bilhões de pessoas usando os métodos de 1960, teríamos que cultivar 82% da área de terra do planeta ao invés de 34%, calcula o economista Indur Goklany. Isso significaria lavrar uma área extra do tamanha da América do Sul sem o Chile.

A maior inovação de diminuição de terra de todas é a capacidade de extrair nitrogênio do ar através do processo de Haber. A agricultura orgânica tira o seu nitrogênio do ar também, mas através de plantas como o trevo e utilizando gado no processo – e isso requer terra. Alimentar o mundo com agricultura orgânica exigiria uma população de mais sete bilhões de gado pastando em 30 bilhões de acres a mais apenas para suprir o adubo.

Mas deixemos de lado a comida. O mesmo ocorre com as fibras. Algodão, lã, seda e linho ainda exigem terra, mas suas produções dobraram desde a introdução dos fertilizantes sintéticos. Em muitos casos, eles deram lugar às fibras “fabricadas pelo homem”, provenientes de fontes mais eficientes. A extensão de terra necessária para vestir um homem ou uma mulher diminui continuamente.

Similarmente, o combustível. Uma fogueira precisa de até dez acres de área florestal intensamente ceifada apenas para aquecer uma casa: mais se você cozinhar o ano todo. Um típico poço de gás de xisto na Pensilvânia ocupa metade de um acre e produz 50.000 metros cúbicos por dia, o suficiente para aquecer 150 casas. Isso significa que a terra necessária para produzir o seu combustível pode ser 1/3000 do que seria se você dependesse da madeira. Por isso uma das melhores maneiras de aliviar a pressão sobre as florestas na Ásia e na África é proporcionar combustíveis fósseis às pessoas – por exemplo, na forma de eletricidade.

O transporte também requer menos terra do que antigamente. Enquanto um cavalo precisa de mais de um acre de pasto e pode transportar uma pessoa 30 milhas por dia, um poço de petróleo na Califórnia produz, todos os dias, em menos de meio acre de extensão, gasolina suficiente para transportar 200 pessoas por 30 milhas. Mesmo se levarmos em conta estradas, pistas, refinarias e fábricas de automóveis, a diferença em passageiros-milhas por acre é esmagadora. Cada melhoramento na eficiência do combustível é uma redução da extensão necessária para produzi-lo.

Moradia também requer menos terra do que antigamente: concreto e aço vêm de pedreiras e fábricas com pegadas minúsculas comparadas com as concessões madeireiras. Inclua o efeito da urbanização, com as pessoas deslocando-se para as cidade em um ritmo acelerado ao redor do mundo, e a extensão de terra necessária para abrigar cada pessoa está diminuindo.

Até para semi-luxos como luz artificial observa-se um declínio da necessidade de terra. Para manter sua casa iluminada com velas de sebo, cera de abelha ou óleo de espermacete das baleias, ou com as antigas lamparinas babilônicas queimando óleo de sésamo, requereriam-se muitos acres de pasto, flores ou solo oceânico . Agora só é necessário um buraco no chão: uma mina de carvão na superfície produz quase tanta eletricidade por acre quanto um campo de milho produziria em 2000 anos.

Então meu ponto é simplesmente esse: as necessidades de terra do homem – como medida em acres para produzir alimento, acres para produzir fibras, combustível, abrigo, iluminação – estão todas diminuindo cada vez mais, e vem diminuindo por um longo período de tempo. Como, então, é possível argumentar que estamos cada vez mais, e mais insustentavelmente, em dívida com o banco ecológico do planeta?

Para esta pergunta você ouvirá três respostas comuns. Primeira: população. O explosivo aumento populacional em oito vezes nos últimos 200 anos foi maior do que a diminuição da necessidade de terra por pessoa. Segunda: recursos finitos. Só é possível produzir certa quantidade por acre queimando muito petróleo, carvão e gás, que são energia solar armazenada de eras passadas, e irão logo esgotar-se.Terceira: poluição. O aumento da produção por acre foi alcançado à custa da poluição do ar e da água e da mudança climática.

Quanto à população, é verdade que qualquer redução da terra usada por pessoa no século XX foi menor do que a quadruplicação da população. Suponha que o processo de Haber, no qual o nitrogênio é extraído do ar, nunca tivesse sido inventado. O século XX certamente teria assistido terríveis penúrias (e crescimento populacional muito menor). Suponha que os combustíveis fósseis não tivessem sido aproveitados no século XIX. A Revolução Industrial britânica teria sido interrompida assim que todos os córregos dos Peninos passassem a ser explorados como moinhos de água. Foi pela diminuição da extensão de terra necessária por pessoa alcançada por essas inovações e muitas outras que se tornou possível o imenso crescimento da população.

Esta é a versão do Paradoxo de Jevons, que recebeu o nome de um economista do século XIX, Stanley Jevons. Ele assinalou que, quando os produtos ficam mais baratos, as pessoas utilizam-se mais deles, de modo que a redução do preço da energia levou ao uso mais esbanjador da energia, enquanto o aumento da disponibilidade de alimento levou à sobrevivência de mais bebês. Hoje utilizamos os acres poupados para auxiliar-nos a acender a luz, dirigir hummers, comer mangas e comprar mansões de uma maneira que impressionaria nossos frugais ancentrais.

Porém, bizarramente, graças a um fenômeno mundial conhecido como transição demográfica, quanto mais ricos e saudáveis e urbanizados nos tornamos, menos bebês nós temos. O ritmo do crescimento populacional têm tido uma diminuição tão abrupta e veloz que a taxa à qual o mundo está adicionando pessoas – em números reais, não apenas porcentagem – caiu pelos últimos 22 anos. Até mesmo na África a taxa de nascimentos está caindo rapidamente. As Nações Unidas estimam que a população mundial irá parar de de crescer completamente quando alcançar em torno de 9,3 bilhões de habitantes em algum ponto depois do ano 2060.

Isso significa que, longe de dobrar como no século XIX, ou quadruplicar como no século XX, a população mundial terá sido multiplicada menos de 1,5 vez durante este século. A decrescente necessidade de terra da vida começará a ter mais e mais impacto. À medida que a taxa de crescimento da população desacelera, a pegada da humanidade passará a encolher. Até 2070, cada redução no uso de terra por pessoa será um ganho para toda a espécie.

Na verdade, isso já está acontecendo agora. A costa leste dos Estados Unidos foi uma vez intensamente cultivada. Hoje em dia ela consiste em ilhas de cultivo em um mar de florestas. Em grande parte das Terras Altas da Escócia, o gado e as ovelhas deixaram os montes para os veados. Se não houvesse subsídios e barreiras tarifárias, uma quantidade muito maior de terra deixaria de produzir no rico oeste.

Sim, mas, como os recursos são finitos, certamente ficaremos sem petróleo, gás, fósforo, cobre, níquel ou quaisquer outras fontes não renováveis? Primeiramente é preciso observar o surpreendente fato de que são os recursos renováveis que continuamente se esgotam: o mamute, baleias azuis, arenques, o pombo-passageiro, florestas de pinho branco, cedro do Líbano, guano. Em contraste, não há nenhum recurso renovável que tenha se esgotado ainda: nem cobre, petróleo, carvão, ferro, urânio, silicone ou pedra. “É uma das previsões mais seguras”, escreveu o economista Joseph Schumpeter em 1943, “que em um futuro calculável viveremos em um embarras de richesse tanto de alimentos quanto de matérias-primas, devido à expansão da produção total com a qual saberemos lidar. Isso se aplica ao recursos minerais também”.

Considere a humilhante falha das previsões feitas pelo modelo de computador chamado World3 no início dos anos 1970. O World3 tentou prever a capacidade de suporte dos recursos do planeta e concluiu, em um relatório chamado Limites ao crescimento, de autoria do Clube de Roma, que o uso exponencial poderia esgotar o abastecimento mundial de zinco, ouro, estanho, cobre, petróleo e gás natural até 1992 e causar um colapso da civilização e da população no século subsequente. O relatório Limites ao crescimento foi enormemente influente, com livros-texto escolares repetindo suas previsões sem as ressalvas. “Alguns cientistas estimam que os suprimentos conhecidos de petróleo, estanho, cobre e alumínio serão utilizados enquanto você estiver vivo”, dizia um deles. Os governos devem ajudar a salvar nosso suprimento de combustíveis fósseis fazendo leis que limitem o seu uso”, opinava outro.

A verdade é que, à medida que as melhores fontes de cobre, fósforo ou petróleo esgotam-se e novas técnicas de extração são inventadas, as reservas antes não tão boas tornam-se economicamente viáveis. No últimos anos, a perfuração horizontal e o fraturamento hidráulico para a extração de gás de xisto dobraram as reservas americanas de gás natural acessível e barato; a mesma tecnologia está agora sendo experimentada na Europa, Ásia e Austrália e promete uma abundância de gás que durará por décadas. Mesmo que o petróleo convencional se torne escasso, as areias betuminosas, o xisto betuminoso e o gás metano assegurarão o suprimento de combustíveis fósseis por pelo menos um século, talvez por muito mais tempo. Eles serão substituídos no mercado pela energia nuclear ou solar barata muito antes de fisicamente esgotarem-se.

Muito bem, mas um recurso que certamente se esgotará, e talvez muito em breve, é a capacidade da terra de absorver o nosso lixo. Se você procura a pegada ecológica humana, não busque apenas na terra, mas no mar, nos rios e no ar. É por isso que a Global Footprint Network enfatiza tanto o sequestro de carbono. A extensão de terra necessária para retirar o dióxido de carbono do ar é vasta. Mas mesmo aqui existem vários tipos de tendências de melhoramentos. O rio Hudson e o Tâmisa têm menos esgoto e mais peixes. A cidade de Pasadena tem menos poluição. Os ovos de aves suecas têm 75% menos poluentes do que no anos 1960. As emissões americanas de monóxido de carbono do transporte diminuíram 75% em 25 anos. O lixo radioativo de testes de armas e acidentes nucleares diminuiu 90% desde o início dos anos 1960.

Quanto ao dióxido de carbono, a descarbonização já está acontecendo. O engenheiro italiano Cesare Marchetti elaborou um gráfico do uso de energia pelo homem nos últimos 150 anos, enquanto ocorria a transição da madeira para o carvão, para o petróleo e para o gás. Em cada caso, a proporção de átomos de carbono e átomos de hidrogênio caiu, de 10 na madeira para 1 no carvão, para ½ no petróleo, para ¼ no metano. Graças ao gás de xisto barato, o metano pode muito em breve eliminar o carvão – o combustível mais rico em carbono – do mercado de eletricidade. Em 1800, os átomos de carbono faziam 90% da combustão, mas em 1935 a proporção era 50:50 entre carbono e hidrogênio e, até 2100, 90% da combustão pode vir do hidrogênio – provavelmente feita através de eletricidade nuclear ou solar. O especialista em energia Ausubel prevê que “se o sistema de energia for deixado funcionar ao seu próprio ritmo, a maior parte do carbono será eliminado até 2060 ou 2070”.

É claro que essas mudanças podem não acontecer a tempo de impedir as mudanças climáticas. (Contudo, eu argumentaria que as evidências mostram que as mudanças climáticas têm sido moderadas e vagarosas por muitas décadas até agora – um argumento para uma outra oportunidade.) Mas o fato é que as coisas estão caminhando na direção certa. A pegada está encolhendo.

Então é com incredulidade que assisto os governos do mundo assiduamente tentando aumentar a pegada ecológica humana enquanto alegam estarem salvando o planeta. Eles exaltam o cultivo orgânico, que significa um aumento maçico na terra necessária para a agricultura. (Não me leve a mal: eu não tenho nada contra as pessoas comprarem produtos orgânicos; eu apenas tenho objeções a elas me dizerem que é uma coisa mais ética a se fazer). E quase todas as medidas defendidas por combaterem a mudança climática – eólica, das ondas, solar, das marés, hidro e, acima de todas, os biocombustíveis – aumentariam a extensão de terra necessária para sustentar o estilo de vida humano.

Se os Estados Unidos produzissem o seu próprio combustível para transporte como biocombustível, por exemplo, seria necessário 30% de terra cultivável a mais do que atualmente é utilizada para a produção de alimento. Onde seriam cultivados os alimentos? O esquema dos biocombustíveis é verdadeiramente um erro terrível, um”crime contra a humanidade”, nas palavras de Jean Ziegler, a relatora especial das Nações Unidas do Direito à Alimentação. Entre 2004 e 2007, a colheita mundial de milho aumentou 51 milhões de toneladas, mas 50 milhões de toneladas foram para o etanol, não deixando nada para suprir o aumento da demanda: por isso ocorreu o aumento dos preços dos alimentos em 2008, causando tumultos e fome. Na realidade, motoristas americanos estavam tirando carboidratos das bocas dos pobres para encherem seus tanques.

Isso poderia ser aceitável se o biocombustível tivesse um grande benefício ambiental. Mas os benefícios ambientais dos biocombustíveis não são apenas ilusórios; eles são negativos. Cada acre de milho ou cana de açúcar requer combustível de tratores, fertilizantes, pesticidas, combustível de caminhões e combustível de destilação – os quais são feitos de combustíveis fósseis. Então a pergunta é: quanto combustível é necessário para produzir combustível? Resposta: a mesma quantidade. Dependendo de qual estudo você cita, cada unidade de energia empregada no cultivo de milho pra etanol produz 71% a 134% em produção de energia. A perfuração e o refino de petróleo, em contraste, geram um retorno de 600% ou mais da energia utilizada.

Cada incremento no preço do grão causado pela indústria do biocombustível significa mais pressão nas florestas, cuja destruição é a forma mais eficiente de se adicionar dióxido de carbono à atmosfera. Além disso, são necessários cerca de 130 galões de água para cultivar e 5 galões para destilar apenas um galão de gaso – supondo que apenas 15% da safra é irrigada. Pelo contrário, são necessários menos de três galões de água para extrair e dois galões para refinar um galão de gasolina. Cumprir o objetivo dos Estados Unidos de produzir 35 bilhões de galões de etanol por ano requereria usar a quantidade de água consumida por ano por toda a população da Califórnia. Não tenha dúvida: a indústria do biocombustível aumenta amplamente a pegada humana.

O mesmo é verdade em relação a outros renováveis. Para se ter uma ideia de como eles consomem espaço, considere que para suprir os atuais 300 milhões de habitantes dos Estados Unidos, com a sua atual demanda de energia de aproximadamente 10.000 watts cada (2.400 calorias por segundo), seriam necessários: painéis solares do tamanho da Espanha; ou parques eólicos do tamanho do Cazaquistão; ou bosques do tamanho da Índia ou do Paquistão; ou campos de feno para cavalos do tamanho da Rússia e do Canadá juntos; ou usinas hidrelétricas com represas um terço maiores do que todos os continentes juntos.

Um engenheiro chamado Saul Griffith tem um nome para essas porções de terra: Renewistan. Ele calcula que para manter o nível de dióxido de carbono em 450 partes por milhão a área dedicada à energia renovável ocuparia um espaço do tamanho da Austrália. Mas não fique com a impressão de que esse é um jeito benígno, suave e verde de utilizar a terra. Um parque eólico na Califórnia mata 24 águias-douradas por ano e pelo menos 2.000 outras aves de rapina; cada turbina nos Apalaches necessita de quatro acres de floresta desmatados. Painéis solares requerem enormes quantidade de aço e concreto. As barragens de marés mudam a ecologia dos estuários. Todos os renováveis precisam estar ligados através de longas filas de postes de energia. Para gerar a energia que mantém o ritmo da civilização com energia renovável significaria voltar ao hábito medieval de industrializar a paisagem, mas com uma população dez vezes maior.

Eis um modo diferente de se pensar a pegada humana. Helmut Haberl, da Universidade de Viena calculou que das 650 bilhões de toneladas de carbono potencialmente absorvidas do ar pelas plantas a cada ano, seres humanos utilizam cerca de 23% para o seu próprio uso: 80 bilhões de toneladas são colhidos, 10 são queimados e 60 são impedidos de crescer por causa de arados, ruas e cabras, deixando 500 para sustentar todas as outras espécies. Isso é o que Haberl chama de AHPPL (HANPP em inglês): apropriação humana da produção primária líquida.

Ela varia muito de uma região para outra. Na Sibéria e na Amazônia, talvez 99% da produção de plantas sustenta a vida selvagem e não pessoas. Em muitas partes da África e da Ásia central, as pessoas reduzem a produtividade da terra mesmo apropriando-se de um quinto da produção – um mato onde animais pastam demais ao ponto de danificar a vegetação sustenta menos cabras do que sustentaria antílopes se fosse a selva.

Mas na Europa ocidental e no leste asiático – e este é o ponto crucial – as pessoas aumentam a produtividade da terra a tal ponto que, na verdade, elas aumentam o fluxo de energia para a natureza, mesmo que tomem metade da produção para si. Graças ao processo de Haber, tanto a população quando a vida selvagem na Europa têm mais para comer.

Isso na verdade suscita otimismo, porque sugere que a intensificação da agricultura na África e Ásia central poderia alimentar mais pessoas e ainda dar mais sustento a outras espécies também. Harber diz: “Essas descobertas sugerem que, em uma escala global, pode haver um considerável potencial para elevar a produção agrícola sem necessáriamente aumentar a AHPPL”.

A pegada ecológica da humanidade é muito grande. É nosso dever encolhê-la. Mas regredir à agricultura orgânica, à autossuficiência, energia renovável ou até mesmo à caça apenas a aumentará, à custa de outras espécie. A melhor maneira de diminuir o tamanho da pegada no século XXI é usar mais tecnologia para aumentar a produtividade, mais fertilizantes para aumentar a produção, mais gás natural – o combustível fóssil menos rico em carbono, menos consumidor de terra e possivelmente mais abundante – para amplificar o trabalho humano e mais prosperidade para diminuir as taxas de natalidade.

Então nossos netos poderão viver vidas de grande riqueza, saúde e sabedoria, enquanto rodeados da vasta natureza selvagem. Mais cidades e mais tigres. Esse é o meu sonho.

Publicado em Change This e Ordem Livre.

 

Compartilhar