Os políticos brasileiros poderiam ter aprendido diversas lições após tudo o que aconteceu durante o século passada – infelizmente, a maioria deles prefere ignorar o que a história tentou lhes ensinar.

Por Diogo Costa

Nos séculos XIX e XX, a vida do europeu comum foi prejudicada, não beneficiada, pelos seus impérios coloniais. O crescimento econômico da Rússia foi freado, não acelerado, pelo planejamento central soviético. As regulamentações progressistas americanas e suas antecipações européias serviram para proteger monopólios no setor de transportes — como as ferrovias —, no setor de varejo — como comércios de luxo —, e também monopólios profissionais, como o dos médicos.  As regulamentações progressistas não ajudaram consumidores.

A legislação “protetora” nos Estados Unidos e o “salário família” na Europa inferiorizaram as mulheres. Psiquiatras armados pelo estado prenderam homossexuais nos Estados Unidos e democratas na Rússia. O New Deal impediu, em vez de ajudar, a recuperação americana após a Grande Depressão.

Os sindicatos elevaram os salários de metalúrgicos e operários do setor automotivo, mas reduziram os salários dos trabalhadores não sindicalizados. Os salários mínimos protegeram empregos sindicais, mas fizeram com que os pobres permanecessem desempregados. Os códigos de construção civil por vezes impediram desabamentos e incêndios, mas sempre garantiram a estabilidade de construtoras bem conectadas deixando a moradia mais cara para os pobres. Permissões de zoneamento e planejamento protegeram os proprietários ricos em vez dos moradores pobres. Controles de aluguel deixaram os pobres e os doentes mentais desabrigados, porque ninguém irá fazer casas baratas quando a lei encarece as construções a força. Os ricos ficam com os apartamentos com controle de aluguel e com as casas históricas nas vizinhanças antes pobres.

A regulamentação elétrica elevou o custo da eletricidade, assim também fizeram as proibições de energia nuclear. As regulamentações financeiras não ajudaram os pequenos investidores. Seguros federais de depósito permitiram que os bancos tratassem seus correntistas de modo irresponsável. O movimento de conservação do oeste americano enriqueceu fazendeiros que utilizaram terras públicas para o gado e enriqueceu empresas madeireiras que utilizaram terras públicas para o corte de árvores. As proibições no comércio de drogas recreativas resultaram no aumento do consumo de drogas, na destruição de bairros pobres e no encarceramento de milhões de jovens. Governos proibiram comércios de agulhas e publicidade de preservativos, e negaram a existência da AIDS.

O Espaço Vital econômico da Alemanha foi finalmente conquistado pela arte privada da paz, não pela arte pública da guerra. A duradoura Esfera de Co-prosperidade da Grande Ásia Oriental foi construída por japoneses de terno e gravata, não por bombardeiros de mergulho. A Europa se recuperou depois das suas duas guerras civis do século XX principalmente pelo seu próprio esforço de trabalho e investimento, e não principalmente por causa da caridade de-governo-para-governo como a Comissão Hoover ou o Plano de George Marshall. A ajuda externa de-governo-para-governo enriqueceu ditadores tiranos sem beneficiar os pobres.

A importação do socialismo para o terceiro mundo, mesmo sob as formas relativamente não violentas de gandhismo-fabiano sufocou o crescimento, enriqueceu grandes industrialistas e manteve o povo na pobreza. As teorias malthusianas concebidas no Ocidente foram colocadas em prática na Índia e especialmente na China, resultando em milhões de meninas desaparecidas. A revolução verde, patrocinada por capitalistas, foi atacada por políticos ambientalistas ao redor do mundo, mas permitiu que lugares como a Índia se tornassem auto-suficientes em cereais.

O poder estatal em diversas partes da África subsaariana foi usado para tributar uma maioria de agricultores em benefício dos primos do presidente e de uma minoria de burocratas urbanos. O poder estatal em diversas partes da América Latina impediu reformas agrárias de acontecerem e patrocinou o desaparecimento de pessoas. A propriedade estatal do petróleo na Nigéria, no México e no Iraque foi utilizada para apoiar o partido no poder, sem causar benefício algum para a população.

Os homens árabes continuaram empobrecidos ao utilizar do poder estatal para negar educação e o direito de dirigir às mulheres árabes. A captura de governos pelo clero corrompeu religiões e destruiu economias. A captura do governo pelos militares corrompeu exércitos e destruiu economias.

Políticas industriais, do Japão à França, serviram de apoio para indústrias falidas, como na agricultura e no varejo, em vez de escolher vencedores. A regulamentação de demissões elevou o nível do desemprego na Alemanha e na Dinamarca, e especialmente na Espanha e na África do Sul. Nos anos 1960, os edifícios ocidentais de moradia inspirados por Le Courbusier condenaram os pobres em Roma, Paris e Chicago a viverem em cortiços.

Nos anos 1970, o socialismo oriental de larga escala destruiu o meio ambiente. Nos anos 2000, os “coletivistas da geração do milênio,” vermelhos, verdes ou comunitários, se opuseram a uma globalização que ajuda os pobres, mas que ameaça dirigentes sindicais, capitalistas ligados ao estado e a carreira de pessoas nas ONGs ocidentais.

Foi assim que a historiadora econômica Deirdre McCloskey convidou seus interlocutores, oponentes do capitalismo liberal, a reconsiderarem suas propostas políticas futuras à luz dos acontecimentos políticos passados.

Fica irresistível adicionar nossas experiências nacionais ao catálogo de fatos elencados por McCloskey:

O controle estatal sobre o valor do café não revigorou a produtividade nacional, mas acelerou o declínio das exportações brasileiras. Políticas trabalhistas copiadas de Mussolini não deixaram os trabalhadores brasileiros mais independentes, apenas menos competitivos. Os projetos das universidades federais não criaram centros globais de excelência acadêmica, mas fizeram com que o suor da família pobre financiasse o curso de antropologia do filho da família rica.

A proibição dos cassinos não deixou o povo mais virtuoso, mas deixou seu vício mais clandestino. Barreiras à importação não estimularam o comércio interno, mas causaram a exclusão comercial dos mais pobres. O planejamento urbano modernista da nossa capital não ergueu a cidade do futuro, mas criou uma ilha de monumentos excêntricos cercada de satélites de pobreza por todos os lados.

A tomada de poder pelos militares não serviu para a restauração de instituições republicanas, mas serviu para a imposição de suas próprias instituições autocráticas. Os desembolsos de um banco de desenvolvimento não popularizaram o empreendedorismo, mas premiaram empresários ligados ao governo. Políticas desenvolvimentistas dos anos 1970 não culminaram em grandes conquistas econômicas, mas na década perdida dos anos 1980.

Gastos públicos financiados por inflação não criaram uma infraestrutura de verdade, mas projetaram uma prosperidade de mentira. A militarização da polícia não diminuiu o número anual de homicídios violentos, mas aumentou o número de execuções sem o devido processo legal. Congelamentos de preços não foram capazes de impedir que a inflação se avolumasse, mas foram capazes de impedir que bens de consumo chegassem às prateleiras.

Substituições de importação não criaram indústrias competitivas, mas financiaram o atraso tecnológico com os impostos dos pobres. Políticas de incentivo à cultura não criaram obras primas, mas fizeram com que a produção cultural respeitasse menos o público e mais a aprovação do financiamento público. Confisco de poupança não serviu para derrubar a inflação, mas serviu para derrubar a confiança no estado de direito.

A expansão do funcionalismo burocrático não fez do país um modelo de administração pública, mas fez com que o Brasil tivesse mais cursos de direito do que todo o resto do mundo. Uma tributação de nível escandinavo não transformou o Brasil numa Suécia, mas transformou Brasília numa Disneylândia.

E assim o Brasil, que terminou o século XIX com vocação para Estados Unidos, entrou no século XXI tentando alcançar a renda per capita do México.

Podemos concluir com McCloskey:

Qualquer um que, depois do século XX, ainda acredita que socialismo, nacionalismo, imperialismo, mobilização, planejamento central, regulamentação, zoneamento, controle de preços, política tributária, sindicatos trabalhistas, cartéis de empresas, gastos públicos, policiamento intrusivo, fé na união entre religião e política, ou que a maioria das propostas de ação governamental totalizante do século XIX ainda são ideias puras e inofensivas para melhorar nossas vidas não está prestando atenção.

 

Diogo Costa é presidente do Instituto Ordem Livre. Trabalhou com pesquisa em políticas públicas para o Cato Institute e para a Atlas Economic Research Foundation em Washington DC. Seus artigos já apareceram em publicações diversas, como O Globo, Folha de S. Paulo e Estado de S. Paulo. Diogo é Bacharel em Direito pela Universidade Católica de Petrópolis e Mestre em Ciência Política pela Columbia University de Nova York.  Alguns de seus textos podem ser encontrados no blog Capitalismo para os Pobres. Texto originalmente publicado aqui.

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