Por Coletivo Nabuco
Sexta-feira, dia 19 de setembro, a guarda universitária da Universidade Federal de Pernambuco iniciou uma ação de retirada de todos e todas comerciantes do campus e avisou que a partir da semana seguinte não seria aceito esse tipo de exercício e haveria bloqueio na entrada. Indivíduos e famílias que trabalham pelas suas vidas, há anos no mesmo espaço, viram seu sustento ser impedido repentinamente, sem nenhuma justificativa.
Vários grupos de estudantes, entre eles o Coletivo Nabuco, se indignaram com a notícia e atuaram com sucesso, na segunda-feira, para interromper o processo de expulsões. Afinal, a quem a atividade incomodava para que fosse tomada tal medida? Estudantes, docentes, funcionários e funcionárias, visitantes ou guardas da segurança, qualquer indivíduo inserido nesses grupos jamais expressou aversão ao trabalho de ambulantes na universidade, muito pelo contrário.
Desmentindo o senso comum, quem está no exercício entende bem de livre mercado: escutando comerciantes, a velha tática de uma grande empresa tentar eliminar pequenos concorrentes foi revelada. “Eles não querem a gente aqui, não, a gente sabe disso! Eles querem botar o preço que for e não estão nem aí! E como nós somos pequenos e os grandões lá têm poder, foram se acovardar com a segurança pra expulsar a gente daqui!”, dizia Seu João, que vende sorvetes “raspa-raspa” há mais de 20 anos no campus.
No gabinete do reitor Anísio Brasileiro, de onde a diretora do centro com o comércio mais movimentado apontou vir a ordem, a secretária nos disse não haver documento algum sobre a ação e, depois de consultar o magnificíssimo por telefone, nos avisou que havia um mal entendido, que a ação da sexta-feira era só um “levantamento” do comércio ambulante no campus. Seu Antônio, vendedor de água de coco e doces que estava conosco na reitoria, expressou bem que realmente deve ter havido um mal entendido enorme entre um “levantamento” e a ordem de expulsão recebida por ele na sexta-feira, que o fez voltar na segunda, intimidado, sem a sua barraca e produtos.
Não satisfeitos com a resposta, exigimos conversar com a fonte dos atos da sexta, o superintendente da segurança universitária Armando Nascimento. Mais uma vez, foi dito que houve um mal entendido entre ele e o seu subordinado, chefe de operações Ivanildo Barbosa, mas que isso seria corrigido com um telefonema em nossa presença: Nascimento confirma com Barbosa a “segunda ordem”, que haveria somente um levantamento. As e os comerciantes sabem muito bem qual foi a primeira.
Eis que Seu João estava certo. Nascimento nos revelou que o motivo do tão falado “levantamento” vinha da sapiência dele sobre um processo que seria aberto pelos locatários contra a administração da universidade, por permitir a atividade, diminuindo seus lucros – e é importante pontuar aqui que boa parte das cantinas estão nas mãos do mesmo grupo corporativo, por meio de licitações. Em suas palavras, se antecipou para fazer um levantamento. Nos ouvidos das e dos comerciantes, se antecipou em atender a nefasta reivindicação corporativista.
Depois de evidenciado o suposto mal entendido e permitida a volta do comércio, a universidade retorna à sua ordem um pouco mais espontânea, pelo menos até que o processo que promete diminuir as liberdades seja de fato aberto. Hoje os e as comerciantes se dizem muito gratos e gratas por esse dia e nós somos a eles por todos esses anos de exercício, nossas relações foram estreitadas e agora é comum o pedido, sempre atendido, para que contemos aos outros alunos o que aconteceu na segunda-feira, da nossa parte mostrando sempre que, na prática, defender o livre mercado é defender as pessoas.
E a aula de amor à liberdade alheia, dada por comerciantes e estudantes, não foi ministrada em uma palestra ou sala de aula e vai continuar reverberando viva na convivência e nos espaços comuns da UFPE.
Participaram desse ato, além de ambulantes e do Coletivo Nabuco, membros dos diretórios acadêmicos de Artes Visuais, Física, Ciência Política e Psicologia e integrantes do Movimento Zoada e Coletivo Feminista Diadorim, com apoio do Brechó Bagatela, do SINTUFEPE-UFPE e de diversos estudantes individualmente. Leia a nota conjunta publicada por esses grupos aqui.
Sempre que preciso, voltaremos a defender essas pessoas e seus comércios. Porque dia a dia elas didaticamente ilustram palpavelmente o que significa a liberdade.
____________________________________________________________________________________________
Publicado também no Estudantes Pela Liberdade
O Coletivo Nabuco é um grupo de ativismo da capital pernambucana, associado à rede Estudantes pela Liberdade. Defendem a liberdade na cama, na feira e em todas as esferas. Além de terem o poder de causar um rebuliço enorme no movimento liberal com coisas simples como as saias de suas mães.