por Fábio Monteiro de Lima

[dropcaps]A[/dropcaps] liberdade de expressão caminha sempre sobre águas turvas no Brasil. Pelos ditos progressistas é vista como um direito ultrapassado,liberal, burguês, que deve ser a todo tempo sopesado e afastado para evitar todo tipo de abusos indeterminado. Os tutores do povo, devidamente instalados no poder, querem controlar quem fala o quê, quando e onde.

A primeira notícia obscura que se publica, a menor visão crítica dos fatos, é sempre vista como fundamento para regrar e controlar a imprensa ou a Internet vista como uma terra sem lei que teima em não se curvar ao Estado-tutor. Esquecem que a proteção da honra e da imagem, pode e deve ser realizada sempre após o dano, havendo medidas legais suficientes para tanto.

Na seara do Direito Eleitoral este debate toma contornos ainda mais dramáticos. Sob o pálio do combate ao abuso do poder econômico e do “uso indevido dos meios de comunicação”, a Liberdade de Expressão é cada dia mais enclausurada e compartimentada sob um sem número de regras, não apenas quanto à forma, mas discretamente sobre o conteúdo.

Hoje as principais restrições à propaganda eleitoral estão na Lei 9.504/97 e são:

  1. Temporal (art. 36-A): é vedada qualquer propaganda eleitoral antes de 06/07, sob pena de multa;
  2. De meio: é proibida a propaganda paga no Rádio e TV (art. 44), assim como opinião (des)favorável, degradar ou ridicularizar, apoio expresso ou velado (art. 45, II e III) a qualquer candidato por estes meios, além de propaganda paga na Internet (art. 57-C);
  3. Local (art. 37): Proibida a propaganda – fixa ou móvel – em bens públicos ou particulares de acesso público, salvo a móvel via pública;
  4. Tamanho: Proibição de outdoor (placa acima de 4m²), adesivo de carro superior a 40x50cm (art. 38, §3º), anúncio em jornal (art. 43) acima de 1/8 de página e revista acima de ¼ de página.

Digno de nota que à mídia impressa é lícito emitir opinião favorável ou crítica a algum candidato, desde que tal ato não seja reiterado ao ponto de se mostrar capaz de induzir o pensamento do eleitorado, caso em que pode configurar propaganda escamoteada (sob pena de multa) ou uso indevido dos meios de comunicação social, podendo levar a cassação do registro ou do mandato.

A realidade que precisa ser encarada urgentemente em uma Reforma Eleitoral é de que esse sistema contribui para a criação de monopólios artificiais do sistema político, criando enormes barreiras à entrada de novos competidores, diminuindo a isonomia e normalidade do pleito, restringindo o exercício de direitos fundamentais, justamente os seus alegados fundamentos constitucionais.

Primeiramente porque, com estas restrições, sobram aos candidatos o horário eleitoral gratuito, a propaganda gratuita em suas páginas pessoais ou dos partidos nas redes sociais, os eventos milionários (ainda que sem showmícios), as carreatas e a panfletagem através dos cabos eleitorais. Em todas estas modalidades as candidaturas daqueles que já estão no poder tem larga vantagem.

O horário eleitoral de rádio e televisão é dividido proporcionalmente às bancadas dos partidos e coligações na Câmara dos Deputados ou nas Assembleias Legislativas, facilitando a permanência das velhas ideias na política. Por outro lado, a simples divisão igualitária não resolveria a situação em um país com 32 (trinta e dois) partidos políticos em funcionamento.

Aos candidatos ao poder executivo ainda sobram os debates, mas no caso do legislativo – com o número absurdo de candidatos decorrente do sistema de lista aberta e proporcional – esta opção é totalmente irreal.

A panfletagem, mídia cara e ineficiente que polui as cidades gerando toneladas de lixo, somente tem utilidade se acompanhada de um exército de cabos eleitorais – cujo trabalho deve ser pago – o que infla os custos da campanha, aumentando a influência do poder econômico. Portanto, a centralidade dos panfletos e santinhos nas campanhas apenas fortalece o abuso que estas regras dizem coibir.

Jornais e revistas são mídias caras e com influência cada vez menor, além do que, o tamanho dos anúncios permitidos impede a melhor descrição de propostas ou posições políticas, se aplicando integralmente as mesmas críticas feitas à panfletagem.

Restaria a internet, a última fronteira do livre mercado de ideias, mas também está é alvo de crescente regulação governamental. A mini-reforma de 2009 proibiu a propaganda eleitoral paga na Internet, restringindo os meios lícitos a propaganda na própria página, o site pessoal ou do partido/coligação, além de mensagens diretas para eleitores prévia e espontaneamente cadastrados.

Ou seja, somente os eleitores que tenham manifestado interesse em acompanhar determinada candidatura é que terão acesso às suas propostas, desnaturando a ideia mais básica da propaganda que é a busca ativa de novos ouvintes. O resultado nós já sabemos, todos os pré-candidatos impulsionam – pagando – suas páginas pessoais até 05 de julho, procedendo desde já a todo tipo de propaganda antecipada. Quem chegar na frente em número de seguidores terá a maior difusão de suas mensagens durante o período eleitoral propriamente dito.

Por óbvio, ainda, que aqueles candidatos que já ocupam cargos públicos, assim como aqueles que estão na mídia através de seus programas de Rádio e TV, despertam muito mais interesse na população nesse período preparatório e terão uma leva maior de seguidores durante a campanha.

Importante ainda lembrar que, proporcionalmente, a campanha – mesmo paga – via internet é muito mais barata que a mídia impressa. Some-se a isso o efeito viral e a possibilidade de participação popular ativa e logo se conclui que a propaganda paga na rede seria capaz de combater a desigualdade eleitoral, fazendo frente ao favorecimento do horário de eleitoral gratuito e ao poderio econômico dos meios impressos.

Para arrematar esse sistema perverso, o controle explícito, a censura imposta à radiodifusão – em menor escala aos jornais – que deve se abster de emitir opiniões e críticas aos candidatos nos três meses que antecedem o pleito, priva o eleitor de avaliações e informações atuais sobre os governos, ou de relembrar fatos positivos e negativos. Tornando a versão propagandeada no bilionário horário eleitoral, com seus fantásticos marqueteiros, a única versão no momento mais delicado da vida política nacional.

A verdade inconveniente é que a nossa regulação de propaganda, como usualmente acontece com qualquer restrição estatal de direitos, torna mais difícil o surgimento de novas lideranças e novas ideias. Favorece, isto sim, os parlamentares que usam por quatro anos a verba de gabinete em benefício próprio, os governantes que estão diariamente no rádio e TV e tem orçamentos bilionários para promover seus governos, as campanhas milionárias que contratam um sem número de cabos eleitorais e imprimem milhões de panfletos.

É necessário, é urgente, um banho de liberdade no sistema eleitoral brasileiro. Dado que o marketing já tornou os eleitores em consumidores, é hora de quebrar esse cartel e fazer valer o livre mercado de ideias, possibilitando a renovação da política e o avanço do país.

 * Fábio Monteiro de Lima é advogado eleitoralista em Brasília. Graduado pela Universidade de Brasília (UnB), é membro da Aliança pela Liberdade, sendo representante discente no Conselho Universitário da UnB.

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