“A coisa de preto” rapidamente se espalhou pelas redes sociais e culminou no afastamento de William Waack do Jornal da Globo.
O fato levantou uma série de discussões: William é racista? Seu comentário foi racista? Ainda existe racismo? Foi apenas um deslize ou uma piada? quais os limites para a repercussão negativa da declaração? Qual é regulação pro caso? E a função das redes sociais? Vivemos a luta entre uma esquerda fundamentalista e a liberdade de imprensa?
https://www.youtube.com/watch?v=yhzgqDdbm4Q
Minha pergunta aqui é mais simples e direta do que todas essas: como a internet contribui para o debate contra a discriminação racial?
A internet é o principal espaço de propagação da informação nos dias de hoje, atingindo todas as camadas da sociedade, aumentando a cada ano.
Em 2016, 68% da população brasileira usava a internet. Nas classes D e E, o alcance chegou a 45% da população. Há dois anos, em 2014, o acesso entre os mais pobres estava pouco acima dos 25%. Esse aumento de 20 pontos percentuais, durante a crise, é uma revolução.
Se o grupo de análise for expandido para quem tem renda de até 1 salário mínimo por membro da família, 56% tem acesso a internet de alguma forma.
No grupo de menor renda per capita da população brasileira, onde estão as famílias que ganham até R$ 158,24 mensais por pessoa, há cerca de 13 milhões de negros. Somos ¾ do total na base da pirâmide, segundo o Programa Brasil Sem Miséria.
Cruzando essas duas informações, concluímos que, quando os mais pobres aumentam seu poder de interação e comunicação, esse acesso afeta fundamentalmente os negros. Mais especificamente, um grupo de negros especialmente vulnerável à violência.
Assim, quem sofre algum tipo de abuso pode fazer uma denúncia instantânea e coletar provas com o celular. Não só William Waack se prejudicou pelo vazamento de um vídeo. O mesmo vem acontecendo com diversos policiais violentos no país, com vários casos publicamente sabidos.
Smartphones são o principal meio de acesso à internet das classes mais baixas e é aí que definitivamente entra nossa reflexão. Com custo baixíssimo, uma imagem ou um vídeo chega a milhões de pessoas e nada mais natural que haja repercussão positiva ou negativa a partir daí.
A dinâmica mudou. Enquanto antes pouquíssimas pessoas tinham dinheiro para ter uma linha de telefone, hoje, com apenas um clique, você pode se comunicar com o mundo inteiro. Assim, surge a democratização do controle social.
Um indivíduo pode buscar apoio e companhia em sua dor ou sua alegria. Com a ampliação do acesso à internet, a liberdade de expressão se aperfeiçoa e pode virar um instrumento de combate ao racismo. Uma ideia errada deve ser combatida com bons argumentos vindos do maior número de pessoas possível.
A força das redes sociais é de dar voz a quem sofreu o isolamento e opressão por anos a fio. Com a internet, as minorias podem gritar ao mundo e se juntar para conquistar objetivos em comum, como o fim da discriminação racial.
As diversas polêmicas sobre propagandas, programas de televisão, manchetes de jornal e declarações de qualquer natureza não tornam o mundo mais chato. Elas são um sinal dos novos tempos. Grupos historicamente silenciados ganharam acesso a um direito fundamental: livre manifestação.
O preto vê, o preto ouve, o preto sente e o preto pensa. Sua voz finalmente pode ser exposta. Ouvi-la é uma questão de humanidade, sensatez e lógica, porque o preto come, o preto bebe, o preto consome e não há mais espaço para tolerância com atitudes racistas, que serão denunciadas e criticadas num volume cada vez maior. O aumento no número de polêmicas é inseparável da maior circulação de vozes negras.
O debate sobre o acesso e o efeito das manifestações é muito importante. Devemos lembrar, nesse 20 de novembro, onde estão os ofendidos e quais suas possibilidades de defesa.
Junte-se você também ao apoio à liberdade de expressão e à expansão do acesso à internet como instrumentos de evolução da nossa sociedade e, especificamente, a serviço do combate ao racismo. Essa não é uma causa de esquerda, direita ou centro. Vem pro nosso lado! Vem pra nossa luta! Vem!