A Nova Matriz Econômica prometeu entregar um crescimento magnífico para o PIB. O mais caro programa de estímulo da história brasileira resultou na maior crise da história brasileira. Entender os custos do desenvolvimentismo petista é, também, entender o que talvez seja o mais importante capítulo recente da história brasileira.

A ‘Nova Matriz’ consistiu principalmente em reduzir taxas de juros à força, controlar a taxa de câmbio, aumentar gastos e subsídios, proteger empresários locais da concorrência gringa, conceder desonerações de imposto e segurar a inflação através dos preços controlados pelo governo. Em resumo, era uma aplicação do receituário desenvolvimentista, bastante comum na história do Brasil.

Não se poderia esperar, portanto, que os resultados fossem diferentes do que aconteceu na crise ao fim do governo Geisel, durante a ditadura: o crescimento foi medíocre, a inflação acelerou e as contas públicas se deterioraram rapidamente – o que, por sua vez, afundou o país na recessão. Foram dois governos separados pelo discurso ideológico, mas unidos pelo mesmo desenvolvimentismo que também causou grave crise nos anos 80.

Saber quanto a Nova Matriz custou é complicado. Diversos métodos podem ser úteis. Seja quais forem os escolhidos, o resultado é sempre o mesmo: muito gasto, pouco retorno.

Mais importante e ilustrativo do que ler sobre bilhões de reais é entender o custo de oportunidade desses gastos, ou o que poderia ter sido feito com tanto dinheiro noutra área do orçamento. Escolhi especialmente o Programa Bolsa Família, porque muitos consideram a política social mais eficaz do Estado brasileiro.

Um dos maiores problemas em gastar mais do que se tem está na necessidade de, futuramente, pagar a dívida reduzindo gastos. Independente de quem for o presidente a partir de agora, o caos nas contas públicas inviabiliza qualquer despesa adicional, inclusive no Bolsa Família.

Custo de oportunidade é isso: o que você não poderá fazer por causa de uma decisão. As restrições do mundo real existem e a resposta a ela está em elencar prioridades. Cabe ao leitor julgar se as políticas a seguir eram mesmo prioritárias com relação aos anos de Bolsa Família que custaram.

Custo da crise: 532 bilhões de reais na produção anual, ou 17 anos do Bolsa Família em 2016

Como a crise atual é amplamente atribuída à Nova Matriz Econômica, alguém poderia sentir-se tentado a usar a queda da renda brasileira para estimar um prejuízo de R$ 532 bilhões. Essa é a queda no PIB acumulado em 12 meses, entre o primeiro trimestre de 2014 e o primeiro de 2017. Posto de outra forma, a produção do país voltou ao nível de 2011.

Fonte: Sistema de Contas Nacionais – IBGE

A cifra é impressionante, mas há uma boa chance de estarmos subestimando o estrago.

A primeira razão é que ignoramos quanto o país cresceria na ausência da Nova Matriz. Se o PIB crescesse a 2% ou 3% ao ano (um ritmo baixo, vale ressaltar), o prejuízo poderia até ultrapassar o trilhão de reais.

A segunda é que, em que pesem os sinais de estabilização, a crise fiscal ainda não terminou e o compromisso do governo com o ajuste das contas públicas é vacilante. Por estes motivos, não sabemos quanto a Nova Matriz nos custou em termos de atividade econômica, embora haja bons motivos para crer que a queda observada de atividade não encerra o debate sobre o custo do desenvolvimentismo petista.

O terceiro motivo é que a queda na atividade não foi decisão de ninguém, mas uma consequência. Além disso, ela foi medida pela queda na produção anual e não considera custos acumulados no longo prazo.

Por outro lado, não faltam exemplos melhores – por terem sido decisões centrais no desenvolvimentismo petista. Nesse caso é mais fácil fazer estimativas e algumas estão disponíveis no livro Anatomia de um Desastre, dos jornalistas Claudia Safatle, João Borges e Ribamar Oliveira.

Expansão do BNDES: 323 bilhões de reais em subsídios entre 2008 e 2014, ou 10 anos de Bolsa Família

Como mencionamos em outro artigo neste Mercado, altamente recomendado para quem não entende direito o que ocorreu no BNDES, o governo federal fez empréstimos vultosos subsidiados através do banco, entre o fim do governo Lula e o primeiro mandato de Dilma.

Além dos resultados decepcionantes no campo do crescimento, estima-se que este subsídio custará R$ 323 bilhões reais de 2016 até 2060 ao Tesouro Nacional e, portanto, ao brasileiro. Isso equivale a cerca de dez vezes o gasto com Bolsa-Família, também tendo como referência 2016.

Desoneração do setor elétrico (MP 579): 105 bilhões de reais, ou três anos de Bolsa Família

Outra tentativa fracassada de estimular o crescimento foi a Medida Provisória 579, que reduziu as tarifas de eletricidade pagas pelo consumidor, sem reduzir o custo de produção dessa energia. Isso teve o efeito indesejado de desarranjar a produção no setor e causar uma escassez de oferta, que culminou na crise energética de 2015, um ano em que choveu pouco.

O governo então teve resgatar o setor e permitir um aumento das tarifas: ao cabo, calcula-se que a população teve que bancar uma conta de R$ 105 bilhões, em parte como contribuinte, em parte como consumidor. Isto equivale a mais ou menos o triplo do que se gastou em Bolsa-Família em 2016.

Desonerações de tributos: 458 bilhões de reais entre 2011 e 2018, ou 14 anos de Bolsa Família

Outro exemplo, bastante desconcertante vindo de uma presidente que se intitula de esquerda, foram as generosas desonerações que concedeu ao empresariado em mais uma aposta para impulsionar a atividade econômica. A Receita Federal estima que o governo abriu mão de R$ 320 bilhões entre 2011 e 2015 e R$ 458 bilhões entre 2011 e 2018. O último montante corresponde a algo como catorze Bolsas-Família de 2016.

Os três programas citados (redução das taridas de energia, desonerações tributárias e expansão do BNDES) custaram cerca de 27 anos do Bolsa-Família (referência 2016). Os resultados deixaram muito a desejar e estão expressos na primeira conta.

Os custos ocultos do desenvolvimentismo petista

Ainda pior é que não chegamos perto de analisar tudo o que se fez sob a égide da Nova Matriz Econômica. Estes são apenas aqueles cujo custo ao Tesouro pode ser mais facilmente estimado. O desenvolvimentismo petista foi muito além.

Há ainda o prejuízo causado à Petrobras, que não tem a ver apenas com corrupção. As regras de conteúdo local, por exemplo, forçaram a estatal a comprar produtos mais caros e de qualidade inferior por serem produzidos aqui. O controle de preços de combustíveis, por sua vez, fez com que a empresa importasse a preços altos e vendesse a preços baixos, de tal modo que Graça Foster tornou-se a única presidente de uma empresa de petróleo que desejava que os preços internacionais caíssem.

A Petrobras teve que entrar em projetos destituídos de sentido econômico. A Refinaria Abreu e Lima foi um grande exemplo. A exigência de participação mínima na exploração de campos do pré-sal esgarçou o caixa da empresa, a ponto de se sentir alívio quando apenas um lance foi dado no leilão do Campo de Libra.

Considerei apenas parte do custo ao Tesouro de uma lista pequena, além da primeira e grosseira estimativa grosseira sobre perda de atividade. Com elas, pode-se ter uma ideia de quão danoso foi o desenvolvimentismo petista. Até mesmo seus antigos defensores a abandonaram, embora continuem a apregoar exatamente as mesmas propostas.

Se aprendermos a lição, não esqueceremos o desastre o que foi a Nova Matriz, nem daremos chance poder para quem quiser repetir essa história macabra.

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