Por Bryan Caplan

Tradução de Arthur Niculitcheff, original aqui

Seu pais está caindo aos pedaços. Desemprego e inflação estão lá no céu. Uma guerra mundial está no horizonte, e protestos violentos tomam as ruas. Mas não tema: Uma eleição está vindo! A situação vai ser mandada embora pelas suas políticas falhas. E a oposição com certeza terá as ideias brilhantes que o país precisa para dar a volta por cima.

Terá mesmo? Talvez no meio dessa confusão toda, as pessoas darão as rédeas do poder para demagogos irresponsáveis, e as condições irão de mal a pior. Essa preocupação não é nada improvável. Quando os “malucos” começam a ter audiência política séria? Somente quando o país já está descendo pelos ralos.

Se olharmos ao redor do mundo, há bastante evidencia circunstancial de que má performance não se corrige sozinha. Um dos fatos mais importantes do crescimento econômico é que, na média, países pobres não alcançam países ricos¹. A principal razão parece ser que países pobres consistentemente tem más políticas². Muitos desses países são democracias. Mas eles quase nunca elegem um candidato pela proposta “Nós precisamos copiar as políticas de países mais bem sucedidos como Honk Kong e Singapura e dar as costas à nossa tradição política falha.”

Então, os lugares mais desagradáveis no mundo para viver geralmente tem três características em comum: Primeiro, baixo crescimento econômico; segundo, políticas que desencorajam o crescimento; e terceiro, resistência à idéia de que outras políticas seriam melhores. Eu tenho uma teoria para explicar essa combinação curiosa³. Imagine que as três variáveis que eu acabei de citar – crescimento, política e ideias – capturam a essência da situação político-econômica de um pais. Então suponha que três “leis da dinâmica” governam esse sistema. As primeiras duas são praticamente verdade por definição:

  1. Boas ideias causam boas políticas.
  2. Boas políticas causam bom crescimento.

A terceira lei é muito menos intuitiva:

  1. Bom crescimento causa boas ideias.

A terceira lei só me veio à mente quando eu estava estudando as crenças do público sobre economia4, e percebi que crescimento de renda parece melhorar o conhecimento de economia, apesar do nível de renda não melhorar. Em outras palavras, pessoas pobres com a renda crescendo – como imigrantes recentes – tem mais senso econômico que a média; pessoas ricas com a renda caindo – como a família Kennedy – tem menos.

Esse modelo esqueleto tem uma implicação surpreendente: Há mais de um resultado com poder de permanência5. A boa noticia é que você pode ter resultados favoráveis em todos os sentidos. Boas ideias levam a boas políticas, boas políticas leva a bom crescimento, e bom crescimento reforça boas ideias. A noticia ruim é que você também pode ficar atolado no resultado oposto. Uma sociedade pode ficar presa numa “armadilha das ideias”, onde más ideias levam a más políticas, más políticas levam a mau crescimento, e mau crescimento cimenta más ideias.

Quando você cai nessa armadilha, tudo o que geralmente precisa é de senso comum para sair. Mas quando as pessoas estão desesperadas, senso comum fica ainda menos comum que o normal. A falta recente de vacina para gripe é um bom exemplo. O senso comum diz que, para aliviar a falta da vacina, você deveria tornar mais lucrativo ofertá-la. Mas a reação de grande parte do público é, em vez disso, atacar os ofertantes gananciosos por falhar em fazer o trabalho deles.

A conexão entre crescimento e ideias é não tanto lógica como psicológica. Não é lógico para as pessoas abraçar ideias contraprodutivas por que as condições estão piorando, mas elas parecem fazer isso de qualquer jeito. Talvez a melhor explicação seja que o público confia numa metáfora militar: Você deve evitar intervenções agressivas do governo nos bons tempos, mas, durante uma crise, você precisa ensinar uma lição aos seus inimigos, não perdendo tempo num exame de consciência sobre como você os provocou. Durante hiperinflações, por exemplo, as pessoas tem mais chance de atacar bodes expiatórios – especuladores e mercado negro – do que culpar uma política monetária descontrolada. Como Jeffrey Sachs observa:

A confusão, ansiedade, e o senso profundo de perplexidade sobre as forças do mercado são inevitáveis quando os chefes de família precisam se preocupar se a renda vai ser suficiente na próxima semana para alimentar sua família… Você não consegue pensar direito no meio da hiperinflação. A sociedade se torna descolada.6

Se você prefere um testemunho em primeira pessoa, poucas pessoas sabem mais sobre abraçar más ideias que o famoso apóstata comunista Whittaker Chambers. Por que ele virou comunista? Por que alguém vira?

[Um] homem, via de regra, não vira comunista por que ele é atraído pelo comunismo, mas porque é levado ao desespero pelas crises na história através da qual o mundo está passando… No Ocidente, todos os intelectuais viram comunistas porque eles buscam as respostas para um de dois problemas: os problemas da guerra ou os problemas da crise econômica.7

Chambers não se dá ao trabalho de explicar porque ele achou que o comunismo era um meio efetivo de resolver qualquer um dos problemas. Poucos comunistas se deram. Mas, quanto pior o mundo parecia, mais certo eles ficavam de que a solução para guerra era repetir a Revolução Russa no mundo inteiro, e que a cura para crise econômica era desapropriar todos os empreendedores e coletivizar a agricultura. Em outras palavras: Ensinar os malfeitores de grande riqueza uma lição que eles nunca vão esquecer. A maioria dos contemporâneos não viraram comunistas, claro, mas, em todo o mundo, condições deteriorantes pareceram inflamar más ideias, levando a más políticas, levando a condições ainda piores.

Se ambas boas e más combinações de crescimento, políticas, e ideias são estáveis, por que as coisas mudam? A resposta, no meu modelo, é sorte. Uma economia na armadilha das ideias geralmente permanece na armadilha das ideias. Mas de vez em quando, ganha uma pequena loteria. Talvez aconteceu do presidente do pais ler Bastiat durante seu ultimo mandato, e decidir tentar uma abordagem mais livre mercado. Isso aumenta o crescimento, que por sua vez melhora o clima da opinião pública. E talvez – só talvez – a opinião publica mude o bastante para eleger outro presidente que abraça as reformas do predecessor.

Um frequente exemplo contrario à minha historia é o colapso do comunismo. Com certeza isso mostra que as pessoas inevitavelmente fiquem espertas? Não. A historia do comunismo é um exemplo poderoso da armadilha das ideias funcionando. Afinal, o comunismo não acabou nas décadas de 20 e 30, quando milhões de cidadãos soviéticos morreram de fome. Medo das represálias de Stalin não explica porque a popularidade internacional do comunismo atingiu o ápice nessa era desolada. O que quer que acontecia, companheiros de viagem avidamente culpavam os contratempos nos resquícios do capitalismo, e suas racionalizações não caiam em ouvidos moucos.

No auge do socialismo, vários economistas olhavam o lado positivo: “qualquer movimento gradual em direção a uma economia planejada centralmente oferece oportunidades de serem experimentados desenvolvimentos desfavoráveis que vão agir como freios”8. Mas Joseph Schumpeter não estava convencido:

[R]esultados que são sentidos como desfavoráveis para grupos suficientemente importantes são prováveis de exercer uma propelente, mais do que exercer uma restritiva, influência – isto é, o remédio para a socialização fracassada que vai se sugerir não será menos que mais socialização. 9

Ludwig von Mises disse a mesma coisa:

A opinião popular atribui todos esses maus ao sistema capitalista. Como remédio para os efeitos indesejados do intervencionismo eles pedem ainda mais intervencionismo. Eles culpam o capitalismo pelos efeitos das ações de governos que seguem políticas anti-capitalistas.10

Em retrospectiva, é tentador descartar Schumpeter e Mises como alarmistas. Mas não tão rápido. Primeiro, a história deles funcionou bem por décadas. Políticas socialistas fracassadas raramente eram abandonadas, e com frequência inspiravam passos mais radicais. Decepção com a União Soviética inspirou políticas maoístas radicais como o Grande Salto Adiante e a Revolução Cultural. Segundo, quando a glasnost e perestroika atingiram o bloco soviético, o nível de vida nos países comunistas nunca esteve melhor. Sempre tinha sido baixo para padrões ocidentais, mas vastamente superior que nos dias de fome de Stalin. Não há motivo pelo qual o Império Soviético não podia ter durado até hoje. Sua liderança simplesmente perdeu a fé.

A opinião comum é que eles perderam a fé porque suas políticas não funcionavam. Mas, se isso fosse verdade, a União Soviética teria acabado setenta anos antes. A reação normal ao fracasso era repeti-lo numa escala maior. Minha explicação, ao contrário, é que o resignado povo soviético finalmente teve alguma sorte chamada Mikhail Gorbachev.11

Um slogan com frequência atribuído a Lênin é “Quanto pior, melhor”12. Somente se a sociedade está a beira do colapso que uma revolução comunista pode ter sucesso. Mas essa atitude vem à tona do outro lado do espectro ideológico também. Murray Rothbard é o exemplo mais pitoresco:

Para uma mudança social radical – uma mudança para um sistema social diferente – acontecer, precisa haver o que é chamado de “situação de crise”. Precisa, em resumo, haver uma quebre do sistema existente que convoca uma busca geral por soluções alternativas.13

Se eu estiver certo sobre a armadilha das ideias, então defensores de reformas de livre mercado devem sempre torcer por bons tempos e melhoras marginais. Um mercado livre em saúde é improvável de emergir depois que o público dos EUA experimente as desvantagens de uma socialização completa. O Zimbábue moderno não é terreno fértil para um experimento libertário. Depressão e desordem beneficiam os Lênins do mundo. Isso quando o publico está mais receptivo a nonsense, a usar estrangeiros sorrateiros e corporações gananciosas de bode expiatório.14 A voz da razão, ao contrário, tem sua audiência mais receptiva quando as coisas correm bem, para que o público esteja calmo o suficiente para pensar racionalmente sobre como melhorar o status quo, e talvez até apreciar o quanto os seus bodes expiatórios favoritos fazem por eles.

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